A Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS) foi criada em 2000 pelo Governo Federal com a
finalidade institucional de regulação, normatização, controle e
fiscalização das atividades que garantem a assistência suplementar
à saúde. Embora seu objetivo seja promover o interesse público e
contribuir para o desenvolvimento da saúde no país, ela não
consegue cumprir seu papel de órgão regulador, mesmo depois de mais
de uma década de existência.
A autarquia vinculada ao
Ministério da Saúde possui demasiada independência política e
financeira, o que lhe dá a regalia de não prestar contas e agir
como bem entende. De acordo com o pesquisador Mario Scheffer, da
Universidade de São Paulo (USP), em 2005, a ANS gastou R$ 79,5
milhões, quando na verdade seus recursos eram de R$ 14,1 milhões.
Já em 2009, os recursos do Tesouro para a ANS foram de R$ 109,9
milhões, enquanto os gastos diretos somavam R$ 195,6
milhões¹.
Além dos números e contas que não
fecham, podem-se enumerar vários exemplos avessos de como a Agência
tem atuado. O mais recente diz respeito à quebra da Samcil Planos
de Saúde. Se a Agência tivesse fiscalizado como deveria a prestação
de serviços, a operadora não teria deixado quase 199 mil
beneficiários sem assistência da noite para o dia. A intervenção
foi tardia, quando a empresa já agonizava, e com um remédio
paliativo, ao determinar que a GreenLine, operadora que não tem
rede credenciada e estrutura suficientes, acolhesse a carteira dos
que já tinham ficado desprotegidos.
O ideal seria ter um fundo de
recursos para socorrer os planos de saúde e seus clientes em
situações de crise. E, no caso de falências, a transferência de
carteira fosse pulverizada e distribuída de forma igualitária entre
empresas idôneas e com boa situação financeira no mercado em que
atuam.
Além disso, o Tribunal de Contas
da União cobrou multa dos gestores da ANS, já que a Agência foi
relapsa ao deixar de notificar as operadoras no que diz respeito ao
ressarcimento das internações de conveniados em hospitais públicos
ou no uso do Sistema Único de Saúde (SUS), nos anos de 2008 e 2009.
Mesmo que alegue problemas administrativos – e eles perduram de
modo absurdo – não é possível desculpá-la por um rombo de quase 1
bilhão de reais² nos cofres públicos. A falta de eficiência da
Agência é imperdoável.
Processos relacionados ao
reajuste por faixa etária, quando o contratante atinge 60 anos, são
muito comuns nos tribunais. O que não é corriqueiro, e estranho, é
que um organismo criado pelo governo ignore o Estatuto do Idoso,
instituído pelo mesmo governo. A lei é desrespeitada por todas as
operadoras que encaram os idosos como carteira podre.
O que a ANS tem feito para coibir
esse abuso, num momento em que aqueles que contribuíram a vida toda
são descartados ou tem de enfrentar processos para fazer valer seus
direitos? Que pessoa, com mais de 60 anos, consegue contratar um
plano de saúde individual a essa altura da vida? E caso consiga,
terá de pagar o impossível, pois os valores correspondem a três ou
quatro vezes mais do que uma aposentadoria média.
O Superior Tribunal de Justiça
(STJ) já determinou que as mudanças preconizadas pelo Estatuto, a
partir de 2004, valem para todos os planos, inclusive os firmados
antes da data e, entende, ainda, que esses contratos são de longa
duração, se renovam no tempo, por isso a lei os alcança. E por que
a ANS, que deveria proteger também os cidadãos, tem entendimento
divergente do Poder Judiciário?
Desde a criação da Agência, a
litigiosidade cresceu no mercado da prestação de assistência à
saúde. Segundo dados publicados no site da própria, o número de
consumidores que registraram reclamações contra planos de saúde é
de 67,94%, de novembro de 2010 a abril de 2011. Isso significa que
muita gente anda insatisfeita com o serviço prestado pelas
operadoras.
Caberia à ANS cuidar, ainda, da
concentração de poder nas mãos de poucos no mercado. Porém,
notícias recentes contam que a Amil Assistência Médica, além de
adquirir a Blue Life e a carteira de planos individuais da Porto
Seguro, comprou também a Medial Saúde e a Lincx Sistemas de Saúde.
A empresa também controla os planos empresariais chamados PME
(pequenas e médias empresas), que têm regras pouco claras. Eles
funcionam como “falsos” planos coletivos para fugir da regra dos
planos individuais.
Ficam então as perguntas:
conseguirá a ANS se reinventar e ter mais sintonia com o Poder
Judiciário? Conseguirá atuar como Agência independente e
transparente nas consultas públicas? Conseguirá assumir seu papel
regulador e educador, promovendo eventos para os vários setores que
atinge e não só para o clube das operadoras ou teremos de ver mais
um órgão ser criado para reparar os erros e negligências que ela
não cessa de cometer?