Discussão sobre aumento de recursos para a área da saúde
ronda o tema da criação de uma nova CPMF
Governadores lançam nesta semana uma nota em que pedem "maior
aporte de recursos" para a saúde e apoiam o pleito da presidente
Dilma Rousseff para que o Congresso aponte novas fontes de recursos
para a área.
Na prática, eles decidiram encampar o discurso do governo sobre a
necessidade de um novo imposto, nos moldes da extinta CPMF, ou
aumentar a taxação de produtos como cigarros e bebidas para custear
a saúde.
Será sobre os cofres estatuais o maior golpe caso a emenda
constitucional 29, que aumenta as verbas para a saúde, seja
regulamentada conforme o texto atual, sem nova fonte de verbas.
A carta tinha até ontem 12 assinaturas - os governadores do
Nordeste e os do PT. Outros sete já haviam se comprometido a
assiná-la. Na última semana, com a pressão crescente no Congresso
para votar a regulamentação da emenda 29, o Planalto cobrou dos
Estados uma posição. Segundo um ministro, os governadores estavam
de "braços cruzados" nessa discussão. Para mostrar a boa fase dos
Estados com o Planalto, a resposta veio na sexta-feira, um dia
depois de a presidente defender, em Minas Gerais, uma nova fonte de
financiamento para a saúde. Os governadores começaram a se
movimentar para lançar uma nota em apoio. Tomaram a frente o
governador do Ceará, Cid Gomes, e seu colega da Paraíba, Ricardo
Coutinho, ambos do PSB.
O Palácio do Planalto queria que a articulação partisse de
governadores que não fossem do PT. Segundo o líder do governo na
Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), o tema da saúde "não pode ser
uma questão partidária".
Segundo o governador Cid Gomes, já há assinaturas de governadores
da oposição. "O problema do financiamento da saúde não é só do
governo federal, é de todos os Estados", disse ele.
Em uma sinalização para os governadores de oposição, a nota
enfatiza "os avanços obtidos pelo SUS ao longo das últimas duas
décadas" - o que engloba governos anteriores ao do PT.
O texto fala da convicção de que os problemas da saúde não se
resolvem apenas com gestão dos recursos existentes e cita o "baixo
investimento per capita" - ponto ressaltado por Dilma na sexta à
noite, em discurso no Congresso do PT.
Até o dia 28, data em que foi marcada a votação da emenda 29 na
Câmara dos Deputados, os governadores irão se reunir com o
presidente da Câmara, Marco Maia, e do Senado, José Sarney. Como
dão como certa a aprovação, na Câmara, da regulamentação da emenda
29, os gestores estaduais preparam para, em conjunto com o Palácio
do Planalto, trabalhar para modificar o texto no Senado, de forma
que se inclua a fonte de recursos.
RIO DE JANEIRO
Sérgio Cabral diz que vai assinar
carta
Rio de Janeiro. O governador do Rio de Janeiro,
Sérgio Cabral, disse ontem que a extinção da Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) "foi uma
covardia e fez muito mal, não ao governo Lula, mas ao povo
brasileiro". Antes de se encontrar com o ministro da Fazenda,
Guido Mantega, Cabral anunciou que vai se juntar a outros
governadores e assinar nota de apoio à criação de uma nova fonte de
recursos para a saúde.
"O governador do Ceará, Cid Gomes, tentou falar comigo na
sexta-feira e não conseguiu, mas eu já havia me pronunciado a
favor. Claro que assino. Acho fundamental esse financiamento à
saúde", disse Cabral.
De acordo com o governador do Rio, o Brasil assumiu um modelo
correto de saúde, incluindo a universalização do atendimento na
Constituição Federal de 1988. Cabral lembrou que poucos países,
incluindo os do Primeiro Mundo, adotaram esse modelo.
"O fato é que, no meu Estado, por exemplo, se você pegar
hospitais que eram referência de bons serviços, apesar de públicos,
no momento da universalização, em 1988, como ocorreu na área da
educação, eles precisaram de financiamento próprio", disse
Cabral.
Recordes de arrecadação
Cabral discorda da avaliação de que o problema é mais da
incapacidade de gerir o sistema público de saúde do que de um novo
imposto, já que a Receita Federal tem registrado, mês a mês,
recordes na arrecadação e o governo federal tem obtido sucessivos
superávits primários. Para o governador, esses recursos são
necessários para expansão dos investimentos que combinam recursos
públicos com privados.
"Essa presença é cada vez mais significativa no Programa de
Aceleração do Crescimento, no Minha Casa, Minha Vida. Tudo isso
requer mais dinheiro público. O governo brasileiro tem o papel,
junto com os governos estaduais e municipais, de alavancador da
economia do país", disse.
Cabral ressaltou que o governo brasileiro não tem se descuidado da
macropolítica econômica para garantir a estabilidade da inflação e
o crescimento do país. "Quando se fala em superávit primário,
não é um palavrão, e sim sinônimo de responsabilidade fiscal",
destacou.
A CPMF substituiu o Imposto Provisório sobre Movimentação
Financeira (IPMF), também conhecido como Imposto do Cheque, que
vigorou de 1º de janeiro de 1994 a 31 de dezembro do mesmo ano, com
alíquota de 0,25% sobre qualquer tipo de transação bancária.
Inicialmente com alíquota de 0,25%, a CPMF foi cobrada em todas as
movimentações financeiras de 23 de janeiro de 1997 a 23 de janeiro
de 1999. Restabelecida em junho daquele ano, com alíquota de 0,38%,
que caiu para 0,30 e novamente foi para 0,38%, vigorou até o Senado
rejeitar a proposta de prorrogação, em dezembro de 2007.
FANTASMA DA CPMF
Destinação da verba ainda preocupa
O deputado federal cearense Raimundo Gomes de
Matos (PSDB-CE), que é membro do Conselho Consultivo da Frente
Parlamentar da Saúde, discorda do aumento de recursos destinados à
área sem uma normatização do que são as ações e serviços de saúde
aos quais os Estados podem destinar seus investimentos. "Muitos
governadores encontram subterfúgios para aplicar a verba em outras
áreas. Tem governadores comprando até fardamento militar", diz
o deputado Gomes de Matos.
Com a regulamentação dos gastos, haveria um acréscimo de R$ 40
bilhões, afirma. "Só isso não resolve, mas ameniza", diz o
parlamentar, que é contra a criação de um novo imposto. "Essa
proposta dos governadores está na contramão", afirma o
deputado tucano, citando um estudo da Confederação Nacional da
Indústria (CNI) no qual 70% da população se manifesta contra o
aumento da carga tributária. "Os governadores estão querendo
minimizar o desgaste que essa proposta representa para a presidente
Dilma", diz.
Para Flávio Saboya, presidente da Federação de Agricultura e
Pecuária do Estado do Ceará (Faec), o que preocupa em relação à
discussão da criação de uma nova fonte de recursos para a saúde é o
histórico negativo da antiga Contribuição Provisória sobre
Movimentação Financeira (CPMF), cuja verba não era destinada
exclusivamente à área. "Qualquer incremento para saúde e
educação é da maior importância, todavia o passado nos deixa
preocupados", afirma Saboya.
Causa nobre
O presidente da Faec acha coerente a proposta de taxação de
produtos considerados supérfluos, como cigarros e bebidas, em prol
de uma "causa nobre" como a da saúde. Outra solução, na visão de
Flávio Saboya, seria a redução de recursos de algumas áreas menos
prioritárias e a destinação dessa economia de custos para a
saúde.
Para Sérgio Bezerra, secretário para assuntos jurídicos do
Sindicato dos Professores e Servidores no Estado do Ceará
(Sindicato Apeoc), a solução está na gestão: otimizar a aplicação
de recursos em um primeiro momento, para depois discutir o aumento
através de uma nova fonte de divisas. "Sou contra criar mais um
imposto ou qualquer taxa. Já pagamos uma das maiores cargas
tributárias do mundo. Não há como discutir essa questão enquanto
houver tanta corrupção neste País", diz o sindicalista.