Um fato curioso começa a chamar atenção na área da saúde: por
que tantas operadoras de São Paulo que, de forma direta ou
indireta, disputaram as vidas da finada Interclínicas saíram do
mercado nos últimos anos?
Saúde ABC, Avimed e Samcil, que acabaram se envolvendo com o
espólio da Interclínicas, já ficaram pelo caminho.
Agora, o setor está de olho nos negócios da Itálica e Greenline,
que, indiretamente, acabaram por adquirir negócios mal sucedidos
que tinham ligação com o tradicional plano de saúde paulista. Será
que elas também vão ser vítimas da maldição da carteira da
Interclínicas?
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) divulgou na semana
passada a nova lista de operadoras que tiveram a venda de seus
produtos suspensa por problemas de qualidade.
Dentre as empresas, Itálica e Greenline, dois planos de saúde que,
há pouco tempo, se posicionavam como consolidadores e hoje amargam
problemas de saúde financeira e de qualidade dos serviços.
A Itálica está sob intervenção da agência reguladora, enquanto a
Greenline passa por reestruturação para recuperar a autonomia de
vendas.
Em entrevista ao Brasil Econômico, o médico José Rafic Chiquie
Sauma, fundador da Greenline, reclamou da postura da ANS, que há
seis meses impede a empresa de vender alguns planos. “Eles fazem
uma análise polêmica, fomos impedidos de vender porque tivemos 47
reclamações em um universo de 490 mil vidas”, conta.
Os problemas das empresas, no entanto, não começaram agora. Em
2009, em uma operação polêmica, a Itálica, na época com apenas 35,6
mil vidas, adquiriu 215 mil clientes da Avimed, operadora de saúde
que sucumbiu a uma grave crise financeira após comprar 210 mil
clientes da Saúde ABC, um plano de saúda do ABC paulista.
A Saúde ABC tem uma história bastante interessante. A empresa
nasceu em 2002 de uma cisão da Samcil, que na época passava por
problemas financeiros e deciciu arrendar parte dos negócios – no
caso, 3 hospitais e 200 mil vidas -, para um membro da família do
fundador, o médico Luiz Roberto Silveira Pinto.
A Saúde ABC pagaria 5% de royaltie para a Samcil sobre o
faturamento de sua carteira, além do aluguel dos hospitais.
Mas os negócios não cresceram a contento e a Saúde ABC acabou
perdendo parte das vidas arrendadas. Em 2004, a Interclínica entrou
em processo de falência. A Saúde ABC conseguiu autorização para
adquirir os 166 mil clientes da operadora de saúde, passando a uma
carteira 341 mil vidas.
Nesse período, a Samcil entrou na justiça para conseguir de volta
sua carteira de 200 mil clientes, juntamente com os três hospitais
na região do ABC.
Mas do espólio da Saúde ABC coube a Samcil apenas os hospitais. Os
clientes ficaram com a Avimed Saúde, que, em 2006, adquiriu 210 mil
beneficiários da carteira da Saúde ABC, somando 380 mil vidas. A
Avimed faliu três anos depois. E a Samcil não teve destino
diferente.
A operadora, que chegou a ter 1 milhão de vidas em carteira, acabou
de forma trágica, inclusive, com a morte do fundador Luiz Roberto
Silveira Pinto, em seu escritório. Coube à Greenline as 190 mil
vidas da empresa, em 2011, quando passou a uma carteira de 516 mil
clientes.
Após a compra das vidas oriundas das empresas falidas Italica e
Greenline chegaram a ter, respectivamente, 250 mil e 516 mil
beneficiários. Os dados da ANS de novembro de 2012 mostram uma
carteira maos modesta: Itálica com 64,4 mil e Greenline com 490
mil.
O problema é que muitas empresas quando compram a carteira de
planos falidos esquecem que a dinâmica do setor de saúde é
diferente.
“Os clientes que ficam em uma operadora com problema são aqueles
que mais precisam, como os crônicos, que preferem não mudar de
plano para evitar carência ou aumento de preço abusivo”, afirmou um
executivo do setor que trabalhou nos processos de aquisição das
empresas citadas.
Ele lembra que esses clientes representam o maior custo dos
planos de saúde. Além disso, há outra variável, os fornecedores,
que acabam correndo atrás da empresa compradora para garantir
pagamentos atrasados. “É uma bola de neve, que acaba afetando todo
o negócio. E a saída é vender”, diz.
José Rafic, da Greenline, garante que a venda, neste momento, não é
uma opção. “Temos recebido propostas, especialmente porque estamos
expostos, mas não tenho planos de vender”, diz.
O dados do terceiro trimestre da Greenline mostram que a empresa
teve um aumento de 27% na receita com a venda de planos de saúde,
para R$ 365,3 milhões, em relação ao mesmo período de 2011. As
despesas, por outro lado, também aumentaram: 43% no período para R$
305,5 milhões.
Mas, o prejuízo da operação teve uma redução significativa, R$ 14,1
milhões no terceiro trimestre do ano passado, contra R$ 189,7
milhões. “Estamos mudando nosso posicionamento de vendas, com foco
em aumentar nosso tíquete médio para R$ 150″, afirma Sauma, que
afirma estar abandonando a venda de planos individuais, cujo
aumento depende de autorização da ANS.
A ANS informou que a Itálica está sob intervenção e não pode
divulgar os resultados ainda.