RIO - Uma cobrança de R$ 20.935, a
título de coparticipação num tratamento oncológico, pegou de
surpresa o empresário Marcos de Souza Costa, de 64 anos, morador de
Palmas, no Tocantins. Além de considerar o valor abusivo, Costa
conta não ter sido informado de quais eram os procedimentos e o
cálculo que resultaram neste montante.
— A primeira cobrança foi de R$ 1.544.
Depois veio essa de mais de R$ 20 mil. Recorri à Justiça para
questionar ambos os valores. Na hora em que você precisa do plano,
ele passa a recusar atendimento ou fazer cobranças abusivas —
queixa-se o empresário, que já havia ido ao Judiciário para
garantir a cobertura do tratamento.
Procurada, a Unimed Palmas disse que
não há lei que proíba a cobrança de coparticipação em tratamentos
de doenças crônicas e que garante ao beneficiário acesso à planilha
de uso, tabela e cálculos de coparticipação em seu site.
Hoje não há limites para cobrança de
franquia e coparticipação, nem obrigatoriedade de procedimentos
isentos. Na semana passada, a Agência Nacional de Saúde (ANS)
revogou a resolução normativa 433, que estabelecia teto de até 40%
para cobrança por procedimentos médicos, que poderia chegar a 60%
nos planos empresariais. A resolução, que foi criticada por órgãos
de defesa do consumidor por fixar um teto muito elevado para
coparticipação sem um debate prévio mais amplo, determinava também
que 250 procedimentos ficariam isentos dessa cobrança. E previa
ainda a prestação de informações obrigatórias pelas operadoras de
planos de saúde, como um extrato mensal sobre coparticipação e
franquia e dados sobre saldos remanescentes de cobrança.
O debate sobre as regras de
coparticpação será reaberto no dia 4 de setembro, quando a ANS
realizará audiência pública. Mas as regras vigentes, diz a agência,
já obrigam a informar os percentuais nos contratos, bem como a
apresentar extratos de utilização de serviços, entre outros dados,
na área dedicada ao usuário no site das operadoras.
FALTA
TRANSPARÊNCIA
Especialistas, porém, criticam a falta
de informação prévia e de acompanhamento das contas para quem tem
planos nessa modalidade. Em uma década, o número de usuários com
contratos com coparticipação triplicou: de oito milhões, em 2007,
para 24,7 milhões em abril de 2018, segundo dados da ANS. Quase 70%
dos contratos empresariais, informa a consultoria Mercer Marsh
Benefícios, incluem essa forma de pagamento.
A disseminação do uso de
coparticipação, diz Ana Carolina Navarrete, pesquisadora em saúde
do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), torna cada
dia mais premente a necessidade de informação. E não basta, diz, a
empresa afirmar oferecê-la em seu site:
— Pelo Código de Defesa do Consumidor
(CDC) e até pela resolução normativa 389 da ANS, o usuário pode
solicitar discriminação detalhada em caso de dúvida. Se as
informações são de difícil entendimento, o CDC está sendo
desrespeitado, e isso deve ser registrado nos Procons.
Para Rafael Robba, advogado
especializado em saúde do escritório Vilhena Silva, a ANS precisa
criar mecanismos mais eficazes para garantir a transparência:
—Dificilmente se tem acesso a cálculos
e preços.
Outro problema é que a conta da
coparticipação pode demorar até um ano para chegar, informa a
Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge). De acordo com a
entidade, o prazo é previsto no Código Civil. Cerca de 70% das
cobranças, no entanto, são feitas feitas entre dois e três meses
após a realização do procedimento, diz a consultoria Mercer Marsh
Benefícios.
A falta de transparência também atinge
os usuários que têm direito a reembolso. A agente de viagens Sheila
Borges Pelúcio, de 69 anos, por exemplo, conta ter ficado chocada
ao receber apenas 1% do valor pago pelo exame de mapeamento
dermatológico corporal, pelo qual pagou R$ 800.
— Tive um câncer de pele e preciso
fazer acompanhamento anual. Ao entregar o recibo, perguntei o valor
do reembolso, mas a atendente disse não ter acesso a essa
informação. Cerca de 20 dias depois, depositaram R$ 8. Gastei mais
do que isso para ir até a sede do plano dar entrada no reembolso —
diz Sheila, acrescentando que lhe negaram informação sobre o
cálculo.
A Unimed-Rio disse que reembolsará o
valor integral do exame à cliente. A cooperativa alegou erro no
cadastro do procedimento pelo médico, o que teria resultado no
valor pago, e garantiu dar acesso às informações aos
beneficiários.
Para saber o valor que receberia de
reembolso de uma consulta da Golden Cross, o analista Alexandre
Assumpção precisou fazer contas a partir de uma fórmula informada
pela operadora.
— Liguei três vezes para a empresa,
mas o serviço é automático, e uma gravação encerra as ligações
recomendando acessar o site. No portal, são exigidas informações
que resultam numa fórmula de cálculo que eu mesmo tive que resolver
— reclama Assumpção, que, em julho, trocou de operadora.
A Golden Cross informa que o
beneficiário pode dar entrada e acompanhar o processo de reembolso
pelo aplicativo e acrescenta que há no site ferramentas que
permitem ao cliente obter prévias ou calcular o reembolso.
Segundo a Federação Nacional de Saúde
Suplementar (FenaSaúde) e a Associação Brasileira de Planos de
Saúde (Abramge), os percentuais de coparticipação e franquia são
informados em contrato e, no portal do beneficiário, no site das
empresas, há extrato de utilização. A Abramge diz não ser viável
fornecer uma lista com valores de procedimentos, pois esses variam
segundo o prestador. A FenaSaúde, por sua vez, informa que algumas
operadoras já disponibilizam tabelas com valores.
Wilson Shcolnik, presidente da
Sociedade Brasileira de Patologia Clínica /Medicina Laboratorial,
diz que o cliente pode pedir aos prestadores de serviço um
orçamento prévio.