Em um setor altamente
regulado, como é o de seguros no Brasil, tentar vender apólices sem
autorização definitiva é como aplicar o golpe do bilhete
premiado
Como acontece no mundo, o setor de
seguros brasileiro é altamente regulado. Afinal, o setor lida com
recursos de terceiros em totais muito elevados. No Brasil,
atualmente, as reservas a cargo das seguradoras ultrapassam R$ 750
bilhões, caminhando para, no final do ano que vem, atingirem um R$
1 trilhão.
Apenas esta ordem de grandeza seria
suficiente para justificar o forte controle exercido pelo Estado.
Mas outras razões importantes somam para que a regulação se dê em
sintonia com que há de mais moderno, como os parâmetros de Basileia
2, adotados na Europa para garantir a solvência das
seguradoras.
A base legal para o funcionamento
do setor é uma das boas leis redigidas no país, o Decreto-lei
73/66, elevado à condição de Lei Complementar pela Constituição de
1988. Em vigor desde 1966, o Decreto-lei 73/66 é a lei que
regulamenta o Sistema Nacional de Seguros Privados, no bojo do qual
nasceu a Superintendência de Seguros Privados (Susep) para ser a
xerife do mercado.
Se nas primeiras décadas a Susep
não teve grande interferência nos destinos da atividade, a partir
de meados da década de 1980, graças aos esforços de João Régis
Ricardo dos Santos e Jorge Hilário Gouveia Vieira, a autarquia
começou a ganhar musculatura, se profissionalizar e assumir tarefas
até então a cargo do Instituto do Resseguros do Brasil (IRB), além
de incrementar as atividades já a seu cargo.
Daí para frente, a Susep foi
adquirindo importância como a reguladora e fiscalizadora do setor,
nos exatos termos dispostos pelo Decreto-lei 73/66. Hoje, a Susep é
uma autarquia federal razoavelmente aparelhada, com corpo técnico
qualificado e capaz de exercer sua missão legal de forma
competente, ainda que padecendo de algumas deficiências que atrasam
principalmente o desenvolvimento de novos seguros importantes para
o país.
Já no campo da fiscalização e do
controle das empresas sob sua responsabilidade, a Superintendência
de Seguros Privados atua com eficiência, tanto que nos últimos anos
não aconteceu a liquidação de nenhuma seguradora mais expressiva,
ao passo que o movimento de criação de novas companhias e de fusões
e aquisições cresceu significativamente.
Para abrir uma seguradora, o
interessado deve solicitar, inicialmente, uma autorização
provisória para a Susep.
No pedido são expostos em linhas
gerais os acionistas, o plano estratégico, ramos de atuação,
capital social, plano de negócios, prazos e outras informações
fundamentais para a Susep fazer a análise do projeto. Deferida a
autorização provisória, os interessados implementam as providências
necessárias para a constituição e o registro de uma sociedade
anônima.
Feito isso, a Susep analisa os
acionistas, origem, qualidade e aplicação dos recursos, capital
mínimo, plano de negócios, idoneidade dos gestores, etc., podendo
exigir mais informações ou providências. Só depois da conclusão
destes trâmites ela autoriza ou não o funcionamento da nova
seguradora. E este processo não é rápido.
Importante salientar que, enquanto
a companhia em constituição não receber a autorização definitiva de
funcionamento, ela não pode operar. Sem estar de posse dela a
companhia não pode desenvolver planos de cobertura, nem registrar
as notas técnicas e planos atuarias na Susep; não pode vender
seguros, não pode assumir riscos, não pode contratar resseguros ou
aceitar cosseguros, nem pode constituir reservas. Legalmente, ela
ainda não é uma seguradora.
É uma disposição impositiva e, para
ficar mais forte, foi criada inclusive a figura de crime contra a
economia popular e de crime contra as relações de consumo para quem
não respeitar as regras do jogo.
Assim, alguém que, ainda que tendo
a autorização provisória, tente vender apólices de seguros antes da
autorização definitiva se equipara às quadrilhas que aplicam o
golpe do seguro, do bilhete premiado ou erguem as pirâmides
financeiras, que há muito tempo esbulham cidadãos de boa-fé que
acreditam na lábia dos golpistas.
* ANTONIO PENTEADO
MENDONÇA É SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO
GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS