Discussão promovida no 22º Encontro de
Líderes mostra as saídas complexas para um legislação em linha com
anseios da sociedade
Há algumas premissas prováveis no
processo de reforma política do País. Primeira, a tal reforma (no
sentido amplo de corresponder entre o desejo do eleitor ao votar e
o resultado final das urnas) não deverá se concretizar, porque, no
máximo, alguns novos ajustes no sistema eleitoral serão aprovados.
Segunda, a aprovação da matéria não deve ocorrer logo, porque a
reforma da Previdência Social deverá concentrar a energia, debates
e atenção dos parlamentares pelo menos no primeiro semestre. Mesmo
assim, a reforma política, tema do painel que reuniu o ex-deputado
Paulo Delgado, o senador Aloysio Nunes e o professor Fernando
Abrucio (FGV/SP), com moderação do presidente da CNseg, Marcio
Coriolano, é tida como estratégica para a normalidade da vida
econômica e para o exercício pleno da democracia.
Em suas palavras iniciais, Marcio
Coriolano destacou que, embora a tradição no mundo corporativo
tenha sido a de discutir os impactos econômicos sobre os mercados
nos últimos anos, hoje há uma clara interligação entre fatores
econômicos, sociais e políticos (aliás, tripé de temas do 22º
Encontro de Líderes) e consequências. “A interdependência desses
fatores é óbvia”, assinalou ele.
Não é por acaso que hoje é necessário
considerá-los (fatores econômicos, políticos e sociais)
conjuntamente. Não é por acaso que o futuro do Brasil, incorporando
crescimento sustentável, ética na política, moral na sociedade,
depende da aprovação das reformas anunciadas pelo governo. Daí
porque, nesse sentido, “todas as esperanças e expectativas se
voltam cada vez mais para o Congresso Nacional”, declarou ele.
Entretanto, segundo especialistas, as
modificações profundas reclamadas pela sociedade, incluindo mexidas
efetivas no sistema eleitoral, no financiamento eleitoral e
partidário, nas regras de coligações, na alteração das datas de
posses, entre outros pontos de uma reforma política mais ampla,
continuarão sendo aprovadas gradualmente.
O professor Fernando Abrucio, autor de
uma das palestras, faz parte dos que não acreditam numa reforma
ampla, mas em mudanças pontuais no sistema eleitoral. “A reforma
eleitoral é importante, mas reforma política é algo mais amplo”,
lembra ele, para quem, apesar de estar longe de ser o modelo ideal,
o atual sistema eleitoral é funcional.
A seu ver, o mais provável é que as
mudanças políticas tomem como base o projeto aprovado no Senado- a
PEC/2016. Entre suas qualidades, a perspectiva de reduzir a
fragmentação partidária e proporcionar aumento da
representatividade; e criar partidos e alianças mais estáveis, em
detrimento da “geleia geral” existente hoje nas coalizões. Entre
limites e fragilidades, o fato de a aprovação da matéria encontrar
um ambiente pouco amigável na Câmara dos Deputados- por afetar
interesses dos partidos menores- e de não haver alusão à
modificação na governança dos partidos, um remédio contra a
oligarquização partidária. E muitos desafios sem respostas: como
aumentar a permeabilidade social dos partidos e assegurar melhoria
do controle institucional dos governos sem impedir a ação dos
eleitos, por exemplo.
Paulo Delgado reconhece que a reforma
política ideal continuará a andar de lado, concordando que o mais
provável é que ocorram ajustes pontuais no atual modelo.
Ele admite que o atual modelo tem
muitas fragilidades e problemas. “A grande crise do modelo atual é
que ele chegou ao máximo da sua falta de virtude, provocando
sobrepolitização do Judiciário, do sistema político e de todas as
questões. Quando o Poder Judiciário, via STF, passa a aceitar
qualquer ação de inconstitucionalidade- qualquer cidadão pode bater
à porta do Supremo, mas só o ministro pode abrir a maçaneta- essa
sobrepolitização evolui. Acho que deveria haver uma certa
contenção. O quadro hoje é mais confuso do que instável. Há dúvidas
nas elites dos Três Poderes e muitos querem ultrapassar suas
competências. Há senador que quer ser juiz, promotor que quer ser
prefeito e juiz que quer legislar”, afirmou ele.
A seu ver, o desdobramento da operação
Lava-Jato para estados e municípios será o momento central para
validar ou não o atual modelo político. Isso porque, se a Lava-Jato
avançar no município, chegará ao juiz e, no estado, aos
desembargadores. Quando chegar ao Judiciário, será possível saber
se o modelo atual tem condições de continuar e se há alguma
racionalidade nele”, disse ele.
A reforma política, concorda o
professor Abrucio, deve também ampliar os controles nos sistemas
subnacionais. “Dezessete governadores fizeram coisas semelhantes ao
que Dilma fez e não foram cassados. E vale lembrar que os
“bandidos” de Brasília nasceram nos estados e municípios. Então,
esses controles precisam ser melhorados para que retorne o
interesse da sociedade em participar da política. Do contrário,
teremos muitos Trumps nas próximas eleições. E Trump pode até ser
divertido, mas não tem a menor graça”, assinalou ele.
Ao avaliar os problemas da reforma
política brasileira, o senador Aloysio Nunes acredita em incremento
progressivo das mudanças. “À medida que os problemas se tornem
prementes e as soluções, consensuais ou amplamente majoritárias, os
aperfeiçoamentos serão possíveis. Mas sempre haverá frustração em
relação à democracia representativa. É inerente à representação a
frustração, porque, como não temos mandato imperativo (ou seja,
ocupar cargo eletivo com obrigação de seguir uma determinada linha
de ação), sempre vão surgir imprevistos na agenda que exigiram
votos que frustrarão o eleitor, sobretudo em momentos como os
atuais”, afirmou ele, referindo a práticas políticas que afrontam a
moralidade.
Para ele, não há solução mágica para
isso (frustração do eleitor). De qualquer forma, ele destaca que a
proposta que tramita hoje no Congresso ataca dois problemas sérios
do modelo político: a fragmentação partidária, que não leva riscos
a governabilidade, mas a torna muito custosa, com a distribuição de
cargos e criação de feudos a cargo de grupos políticos. O outro
problema é voto e seu resultado. Em eleição recente em São Paulo, o
eleitor votou no Tiririca e elegeu Genoino, em razão justamente das
coligações”, exemplificou.
Segundo ele, hoje há 11 partidos na
Câmara dos Deputados que elegeram de um a cinco parlamentares. E
cada um deles tem um líder, voz no colégio de lideres e no
encaminhamento das votações. Logo, cada um deles se sente dono de
uma parcela do Poder Legislativo e apto a negociar com o Poder
Executivo.
Sobre a proposta já aprovada no
Senado, o senador afirma que essa emenda tem muita chance de ser
ratificada pela Câmara dos Deputados, mas não no primeiro semestre.
Para ele, há um cenário mais favorável na Câmara, porque os
pequenos partidos podem formar uma federação, mantendo-se
ativos.