A Operação Lava
Jato apura suposto esquema de pagamento de propina por
contratos na Postal Saúde, gestora dos planos de assistência
médica de funcionários dos Correios. Para conseguir
fechar negócio com a operadora, uma empresa
teria pago suborno a dirigentes da estatal
ligados ao casal de ex-ministros Paulo
Bernardo (Comunicações) e Gleisi Hoffman (Casa
Civil), senadora pelo PT paranaense. As informações estão sendo
tratadas num acordo de delação premiada.
Conforme trechos
da denúncia, aos
quais o Estado teve acesso,
a Unibem Medicina e Segurança do Trabalho pagava aos
responsáveis por viabilizar o negócio uma comissão sobre o
valor mensal recebido da Postal Saúde. A empresa presta serviços de
saúde ocupacional, fazendo exames nos funcionários dos
Correios.
Entre os supostos beneficiários de
vantagens ilegais, estariam o ex-vice-presidente de Gestão de
Pessoas dos Correios Nelson Luiz Oliveira de Freitas, o ex-diretor
da Postal Saúde Alexandre Câmara e o ex-conselheiro dos Correios
Leones Dall’Agnol. Ele foi chefe de gabinete de Gleisi na Casa
Civil e de Bernardo nas Comunicações. Os três ocuparam os cargos na
gestão de Paulo Bernardo à frente das Comunicações, ministério
responsável pela estatal.
Conforme a denúncia, a Unibem
começou a negociar com a Postal Saúde em novembro de 2013, por
indicação de Freitas. O acerto da propina a ser paga teria sido
feito em reuniões entre os administradores da prestadora de
serviços com os dirigentes da Postal Saúde, entre eles Câmara. O
contrato foi fechado no ano seguinte.
Um pagamento inicial, de R$ 2
milhões, teria sido feito pela operadora para viabilizar
investimentos. Desse total, R$ 900 mil teriam sido rateados entre
os envolvidos. Conforme o colaborador, R$ 200 mil foram pagos a
Câmara e outros R$ 200 mil para Freitas. Outro beneficiário, uma
pessoa identificada como “Carlos Santana”, teria ficado com R$ 300
mil.
Os pagamentos ao ex-vice presidente
dos Correios seriam feitos por meio de depósitos em contas
bancárias supostamente indicadas por ele.
Com o início da prestação dos
serviços, a Unibem teria passado a pagar 8% do valor mensal
recebido da Postal Saúde a um intermediário. Essa pessoa seria a
responsável por repassar a metade, equivalente a 4%, a Freitas. As
transferências seriam por depósitos bancários, cheques ou em
dinheiro vivo.
A Lava Jato também recebeu
informações de que Dall’Agnol ficava com outros 4% dos valores
pagos à empresa. Os pagamentos seriam feitos pela Unibem a uma
empresa ligada ao ex-chefe de gabinete de Gleisi e Bernardo.
O delator, cujo nome é mantido em
sigilo, reuniu contrato de prestação de serviços, notas fiscais,
extratos e boletos de transações bancárias, cheques e trocas de
e-mails, entre outros documentos, como prova do suposto
esquema.
COM A PALAVRA:
Nelson Freitas, ex-vice presidente
de Gestão de Pessoas dos Correios, disse que jamais recebeu
“qualquer valor” pela contratação da Unibem. Em nota, ele afirmou
que não se recorda de ter marcado reuniões entre os negociantes do
contrato e ressaltou que, embora seja vinculada aos Correios, a
Postal Saúde é “uma entidade privada
autônoma”.
Freitas alegou não ter tratado do
negócio com representantes da Unibem ou da operadora de saúde. “Não
era minha competência. Essa contratação é da alçada da Postal
Saúde, que possui gestão própria e independente da sua mantenedora,
a ECT (Empresa de Correios e Telégrafos)”, sustentou.
Ele explicou que, durante a
execução do contrato, apenas acompanhou reuniões técnicas para
resolver problemas que afetavam “a rotina de trabalho” dos
Correios, “pois havia certa incompatibilidade entre a agenda de
prestação de serviços da Unibem e a jornada de trabalho dos
empregados da ECT”.
O Estado não conseguiu localizar Leonis
Dall’Agnoll.
Alexandre Câmara disse que a
acusação não tem cabimento. Segundo ele, houve uma negociação
normal, e sem ilicitudes, para a contratação da Unibem. Ele
explicou que a prestadora de serviços passou por uma “peneira” de
15 empresas do setor, que disputavam o contrato. A escolha se
deveu, segundo ele, a critérios técnicos, como melhores estrutura e
preço, além da possibilidade de se usar um sistema eficiente de
informações para registrar e acessar os exames.
Câmara pontuou não saber se houve a
indicação da Unibem por qualquer pessoa. Ele explicou que a Postal
Saúde identificou a empresa após pesquisa no mercado.
Gleisi e Paulo Bernardo afirmaram
não ter qualquer informação sobre a investigação e que,
possivelmente, trata-se de “mais um desses vazamentos que acontecem
o tempo todo”. Em nota, os ex-ministros alegaram desconhecer
“completamente esse assunto” e não ter “nada a comentar”.
A Unibem não respondeu aos
questionamentos do Estado, enviados por
e-mail. Por telefone, o diretor executivo da empresa, Edvaldo
Galano, disse que desconhece irregularidades. “O processo que eu
acompanhei não foi esse”, sustentou, acrescentando que a escolha da
empresa levou nove meses e envolveu muitas etapas, entre elas
provas de conceito e cotações de preços. “Foi um processo de venda
normal.”
A Postal Saúde não informou o valor
pago à Unibem, justificando que a informação é protegida por
“cláusula de confidencialidade”. Em nota, informou que todos os
contratos estão sendo examinados pela área de auditoria dos
Correios. Conforme apurou o Estado, o
trabalho começou por haver indícios de malversação dos
recursos.
A Postal Saúde informou também que
sua nova gestão – iniciada em dezembro de 2015, após o PDT
passar a comandar os Correios – está revisando todos os contratos e
substituindo membros dos conselhos Fiscal e Deliberativo por
servidores de carreira. O comunicado diz ainda que o contrato com a
Unibem foi rescindido, mas não esclareceu o motivo.
COM A PALAVRA, OS
CORREIOS
“Com relação à reportagem publicada
nesta segunda-feira (21) pelo Estadão online, os Correios
esclarecem que têm adotado uma série de medidas para apurar, coibir
e punir quaisquer desvios que possam ter ocorrido na Postal Saúde —
Caixa de Assistência e Saúde dos Empregados dos Correios. Desde que
tomou posse, em novembro de 2015, a nova gestão da estatal
aprofundou a auditoria naquele órgão, com revisão de todos os
contratos; substituiu os membros dos conselhos Deliberativo e
Fiscal; instaurou comissão de investigação preliminar pelo órgão
correcional dos Correios e solicitou compartilhamento de documentos
e provas ao Juiz federal responsável pelo inquérito no âmbito da
Lava Jato. Os Correios continuam à disposição das autoridades e são
os maiores interessados na apuração dos fatos.”