No total, 886.909 brasileiros perderam o plano de saúde
empresarial em março deste ano na comparação com o mesmo mês do ano
passado(Thinkstock/VEJA)
Priscilla Palma, de 37 anos, desempregada há um ano, foi
demitida da Fundação ABC, em São Bernardo do Campo, onde prestava
serviço como agente de saúde. Hipertensa, assim como o marido,
Paulo Targino, teve de recorrer ao Sistema Único de Saúde (SUS)
para acompanhar a doença crônica. Além disso, um de seus dois
filhos, de oito anos, tem problemas na glândula tireoide, o que a
obriga a levá-lo ao médico periodicamente. O caso de Priscilla
ilustra a reação em cadeia surgida com a onda de eliminação de
postos de trabalho que o país enfrenta - e que já
afeta 11,4 milhões de pessoas, segundo o Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE): com o emprego, ela perdeu o
plano de saúde, setor igualmente afetado pelo fechamento de vagas
de trabalho.
Quando empregada, Prisicilla pagava uma taxa mínima de 180 reais
pelo benefício médico a todos os integrantes da família. Em um
plano particular, o valor subiria para pelo menos 500 reais. "Isso
não cabe no orçamento da família", lamenta a atual estudante de
radiologia. "Temos outras prioridades, como pagar as contas de
casa, alimentação e comprar outros produtos básicos."
Assim como ocorreu com Priscilla um ano atrás, 886.909
brasileiros perderam o plano de saúde empresarial em março deste
ano - dado mais recente -, uma retração de 2,66% em comparação com
o mesmo mês do ano passado, segundo a Associação Nacional de Saúde
(ANS).
A retração tem relação direta com a deterioração do mercado de
trabalho. O conjunto de planos - individuais e corporativos -
somou 48,24
milhões em março, segundo a ANS. São 2 milhões de
planos a menos em um intervalo de apenas doze meses - em março de
2015, havia 50,2 milhões.
Para o diretor do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar
(IESS), Luiz Augusto Carneiro, a perspectiva para o segmento é de
piora até o fim do ano. "Não há motivos para acreditar em uma
reversão, já que análises econômicas apontam para um desemprego de
até 15% em 2016", diz. Ele afirma também que, para piorar a
situação, os custos médicos têm crescido muito acima da inflação.
"Os preços de exames, terapias e, sobretudo, de internação não
param de subir", diz. "Isso causa um problema estrutural no
setor."
Renata Vilhena Silva, advogada especialista em direito à saúde,
afirma que as classes mais prejudicadas são as C e D. "O demitido,
como perde a renda, muitas vezes não tem como manter o benefício.
Quanto mais baixo o escalão, mais chão de fábrica, menos
condições", explica. "Via de regra, quem faz questão de manter o
plano é o aposentado. O demitido, muitas vezes, tem esperança de se
recolocar no mercado."
Na outra ponta, os médicos também têm sofrido consequências.
Diante de uma demanda reduzida, a possibilidade de ser
descredenciado aumentou. O casal de endocrinologistas Christina e
Sinval Muniz já sentiu esse impacto. "Recebemos um aviso que, a
partir do dia 13 de maio, não atenderíamos mais via convênio por
causa da readequação do modelo de trabalho", diz Christina. "Esse é
o discurso oficial."
Questionada sobre um possível descredenciamento em massa, a
FenaSaúde - entidade que representa as operadoras de planos de
saúde - disse que não tem registro desse movimento. "Quando
ocorrem, os descredenciamentos são pedidos pelos próprios médicos
ou encontram justificativa técnica conforme cada operadora",
afirmou, em nota. A despeito do cenário desfavorável, a presidente
da entidade, Solange Beatriz Palheiro, acredita em melhora para o
segmento. "Há forte expectativa quando à recuperação da economia
ainda ao longo deste ano, o que certamente reverterá essa queda na
adesão aos planos", diz.
A reportagem procurou as maiores seguradoras de saúde do país. A
Unimed disse que não houve descredenciamentos no primeiro trimestre
deste ano. "Há um processo contínuo de aperfeiçoamento da rede, com
o credenciamento de novos médicos sempre que necessário", diz. Amil
e a SulAmérica disseram que não iam se pronunciar, já que a
FenaSaúde era a entidade autorizada a falar pelo setor. Bradesco
Saúde não respondeu até o fechamento desta matéria.
Direitos - Para ter direito ao plano de
saúde corporativo, o ex-funcionário deve ter sido demitido sem
justa causa e contribuído mensalmente com parte da fatura do plano
de saúde. Após o desligamento da empresa, o ex-funcionário deve
manifestar o interesse em manter o benefício no prazo de até 30
dias após o comunicado da empresa, além de assumir o valor integral
da mensalidade.
De acordo com resolução da ANS, a duração do contrato no plano
empresarial equivale a um terço da vigência do vínculo trabalhista.
O limite mínimo para manter o direito ao benefício é de seis meses
e, o máximo, dois anos. Na prática, se uma pessoa foi demitida após
contribuir com as mensalidades por três anos, ela terá direito a
permanecer no plano por doze meses.
Para os aposentados, a regra é diferente. Os que contribuíram
com as mensalidades por dez anos ou mais têm o direito de
permanecer no plano durante o período que quiserem. Se ficaram na
empresa por um período inferior, cada ano de contribuição dá
direito a um ano no plano empresarial após a aposentadoria.