ANS decide engavetar cerca de 10 mil queixas de consumidores
contra as operadoras de convênio médico por falta de capacidade de
atendimento. TCU já identificou problemas
A razão de existir da Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS) é a proteção e defesa do usuário de plano de saúde. O órgão,
encarregado de regular e fiscalizar o setor, estampa em sua página
na internet que o consumidor é o protagonista de suas ações. Mas a
prática revela que o usuário não passa de mero figurante. No início
do mês, a Diretoria de Fiscalização, responsável pelo atendimento
às reclamações dos consumidores, mandou engavetar, por meio de
memorando interno, todas as queixas e consultas acumuladas desde
março sem resposta – em torno de 10 mil. Quem quiser que
reapresente a queixa, "fornecendo o maior número de informações
possível sobre o caso relatado".
Essa é a resposta que os consumidores que perderam o tempo nos
últimos meses acessando os canais de atendimento da agência, que
custam R$ 4 milhões por ano, têm recebido. A justificativa da
agência é que o sistema de cadastros de demandas do “Fale com a
ANS” passou por processo de mudanças e que, por isso, as demandas
ficaram “impossibilitadas de serem tratadas”. Mas não é de hoje que
a ANS atende mal ao usuário. Auditoria do Tribunal de Contas da
União (TCU) realizada no órgão entre 2008 e abril de 2009 já havia
detectado que o serviço de atendimento ao consumidor funcionava
mal.
Segundo o relatório do TCU, não foram apresentados indicadores
sobre taxa de resposta aos usuários, de reabertura de demanda ou
outros indicadores de resolução das consultas e reclamações. Há
dois anos, a ANS apresentou ao TCU a mesma explicação que tem dado
atualmente aos consumidores que reclamaram neste ano e não foram
atendidos: de que a central de atendimento está em processo de
mudanças para otimizar os serviços prestados. Foi o que os
auditores do TCU ouviram dos responsáveis pela Gerência-Geral de
Relacionamento Institucional em reunião realizada na sede do órgão
em 13 de junho de 2009.
Em março deste ano, a ANS chegou a avisar em sua página que “o
tempo de resposta das demandas” encontrava-se “um pouco maior que o
usual”, ressaltando que o atendimento ao consumidor permanecia “em
plena atividade pelo Disque-ANS (0800 701 9656)”. Na realidade, o
Disque-ANS já estava entrando em colapso.
Ao Estado de Minas, a ANS minimizou o problema. Informou que “os
cidadãos que entraram em contato durante o período foram
respondidos diretamente pela Central de Atendimento Disque ANS”.
Segundo a agência, só não foram respondidos “os que não ofereceram
elementos suficientes para a resposta”. Para eles, afirmou, foi
encaminhada mensagem solicitando o reencaminhamento da demanda. A
ANS disse ainda que “não confirma o número de 10 mil”, mas não
informou quantas ficaram sem resposta.
SUS mais rápido
Os consumidores estão indignados. Margarete de Brito já
protocolou diversas reclamações desde março. Para sua surpresa,
recebeu três e-mais de resposta da ANS, todos dizendo para ela
reapresentar a queixa, se tiver interesse. O servidor Valdemar
Valverde já cansou de enviar e-mais para o órgão, sem obter
resposta. “Se fosse um caso de vida ou morte, o paciente já estaria
enterrado”, reclamou. Foi o que aconteceu com o aposentado Affonso
Luccas, de 85 anos. Ele morreu num hospital público em São Paulo,
sem obter resposta da ANS.
Ivone Ribeiro constatou que o Sistema Único de Saúde (SUS) é
mais rápido que a ANS. Ela protocolou reclamação em 5 de maio por
causa da negativa de seu plano de cobrir uma cirurgia. Sem resposta
da ANS e do plano, recorreu a um hospital que atende pelo SUS para
fazer a cirurgia. “O SUS me atendeu mais rápido”, desabafou.