Pesquisa brasileira sobre um novo tipo de doença, a tireoidite
química autoimune, foi aceita para publicação em um dos periódicos
mais conceituados sobre imunologia, o Journal of Clinical
Immunology. O estudo, da professora de endocrinologia da Faculdade
de Medicina do ABC (FMABC), em Santo André (SP), Maria Angela
Zaccarelli Marino, analisou, durante 15 anos, moradores da capital
paulista e de quatro cidades do Grande ABC. Ao todo foram avaliados
mais de 6 mil pacientes e o resultado sugere a descoberta do novo
tipo de doença.
A pesquisa teve início após a constatação de muitos casos de
tireoidite crônica autoimune na região da divisa entre Santo André,
Mauá e São Paulo, onde estão instaladas indústrias do setor
petroquímico. Os moradores estudados, de 1989 a 2004, foram
acompanhados por consultas médicas e exames laboratoriais de sangue
com dosagens dos hormônios tireoidianos.
Foram avaliadas 6.306 pessoas com idades de 5 a 78 anos. De
acordo com a pesquisadora, os pacientes foram divididos em dois
grupos segundo o local de moradia. Na região próxima ao parque
industrial petroquímico estavam 3.356 pacientes do grupo 1. O grupo
2 foi composto por 2.950 de uma região afastada de área
industrial.
Os resultados mostraram que, em 1992, somente 2,5% da população do
grupo 1 sofriam de tireoidite crônica autoimune. Em 2001, o mesmo
grupo já apresentava taxa de 57,6%. Já a população que vivia longe
da área químico-industrial não teve aumento significativo no
período. Na comparação geral dos 15 anos, o grupo 1 apresentou 905
pacientes com a doença, contra somente 173 do grupo 2. A região que
concentra as indústrias petroquímicas tinha cinco vezes mais casos
de tireoidite crônica autoimune na comparação com a área
residencial estudada.
Os resultados levaram a pesquisadora a sugerir o novo tipo de
doença: a tireoidite química autoimune, ligada a fatores
ambientais, principalmente à poluição por agentes químicos. “A
poluição pode ser o fator desencadeante para formação de anticorpos
antitireoideanos, que são substâncias que agridem a glândula
tireoide ocasionando a tireoidite crônica autoimune. Os poluentes
funcionariam como gatilho para desencadear o problema”,
detalha Dra. Maria Angela.
A pesquisadora alerta que a tireoidite crônica autoimune está
relacionada com outras doenças autoimunes, como a esclerose
múltipla, artrite reumatoide, diabetes tipo 1, hepatite crônica
autoimune, vitiligo e lúpus eritematoso sistêmico. “Em
crianças, o aumento de casos de tireoidite crônica autoimune foi
acima de 40% no período estudado. São dados preocupantes, visto que
a doença é a maior causa de hipotireoidismo primário, que se não
for tratado adequadamente pode levar a danos
irreversíveis”.
Gilda Martins descobriu que estava com tireoidite crônica autoimune
em 2004, por meio de um exame de rotina. Ela mora em Santo André,
perto das indústrias petroquímicas, há 20 anos. “A doença
atrapalha muito. Eu sempre fui uma pessoa ativa, não sou parada.
Com essa doença eu subo uma ladeira e me sinto cansada, Não tenho
mais um bom sono, é a noite toda acordando, fora os problemas
respiratórios”.
Gilda terá de tomar um medicamente diariamente, até o fim da vida,
para repor as substâncias que não são mais produzidas pela tireoide
afetada pela doença. “Por não ter uma noite tranquila, fico
muito irritada a ponto de explodir, e a pele muito seca, unhas
quebradiças”, acrescenta.