Durante o ensino superior, conciliar
estágio e estudos, tirar boas notas, entregar o TCC parecem
desafios muito grandes. Só que, depois da formatura, aparece um
obstáculo muito maior (e que se agiganta com a crise e o
desemprego): ingressar no mercado de trabalho.
Escolher um curso, passar no
vestibular, arrumar dinheiro (para se manter durante a graduação,
pagar a mensalidade ou os dois), estudar, participar de projetos de
pesquisa e extensão, integrar empresa júnior, estagiar, entregar o
Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e, depois dessa maratona toda,
finalmente pegar o diploma. A partir daí, a expectativa de
conseguir emprego é grande.
Contudo, apenas o título de bacharelado, licenciatura ou tecnólogo
não é suficiente para garantir inserção no mercado de trabalho.
Quem está saindo dos bancos das faculdades tem pouca (às vezes,
nenhuma) experiência na área pretendida, ficando atrás na corrida
por uma vaga. Complicam ainda mais a situação a crise econômica e o
aumento do desemprego.
Não à toa a empregabilidade é a maior preocupação da comunidade
acadêmica brasileira. A conclusão é de estudo elaborado pelo
Instituto Ipsos para o Grupo Santander, ouvindo mais de 9 mil
estudantes e professores em 19 países, cerca de 850 no
Brasil.
Para 54% dos entrevistados, é
preciso melhorar a inserção dos recém-formados no mercado de
trabalho, e 63% acreditam que as universidades não conseguem munir
os alunos das competências exigidas pelas empresas.
Anderson Pereira, diretor da Universia (rede do Santander
Universidades que reúne cerca de 1.300 instituições acadêmicas) no
Brasil, acredita que os empregadores brasileiros não têm
resistência a recém-formados. O que acontece é que um currículo
mais cheio ainda faz diferença. “Para vagas básicas, não se espera
experiência. Mas é verdade, sim, que quem tem alguma experiência
sai à frente, mesmo que não seja na área da posição ofertada”,
diz.
“Há, porém, maturidade do empresariado brasileiro no sentido de
entender que o aluno que passa por uma universidade traz retorno”,
completa. Tanto é que pessoas com ensino superior chegam a ter
salário 38,19% maior em comparação com nível médio, segundo
pesquisa do site de empregos Catho.
O levantamento também concluiu que
ter um diploma de graduação é vantagem comparativa para concorrer a
posições que não exigem nível superior. E, durante a recessão, são
justamente essas vagas que têm sido ocupadas por boa parte dos
egressos das faculdades. A análise é de Rodrigo Capelato,
diretor-executivo do Semesp, entidade que congrega mantenedoras no
país.
“As boas posições estão mais escassas. A empregabilidade para quem
tem ensino superior não diminuiu, mas os graduados estão pegando
posições que não aceitariam em momentos de pleno emprego, estão
indo para o subemprego”, comenta. “Você subaproveita uma mão de
obra qualificada. Um engenheiro de produção que começa a trabalhar
como assistente administrativo se pergunta: para que fiz a
faculdade, então?”
O índice de empregabilidade do primeiro trimestre do ano elaborado
pela entidade demonstrou que o saldo de empregos foi positivo (em
cerca de 100 mil postos de trabalho) para quem tem graduação.
A conclusão de Rodrigo Capelato é de
que a situação é, sim, complicada, mas profissionais com ensino
superior sofrem menos o impacto da recessão. “O desemprego é pior
para quem não tem diploma, que é uma salvaguarda neste momento de
crise”, aponta.
Um grande problema é o desencontro entre a quantidade de vagas
ofertadas em cada curso no ensino superior e o número de
oportunidades no mercado de trabalho: se as instituições baseiam a
oferta na simples procura dos alunos, o resultado é um grande grupo
de pessoas com diploma entrando em áreas saturadas ou com pouco
emprego. “As instituições de ensino privadas, responsáveis por
formar a maior parte dos graduados do país, farão o que a demanda
quer. Para haver mudança nesse sentido, seria necessária política
de estado, para entender em que áreas o país precisa de mais
gente”, sugere.
Acompanhamento
“O índice de empregabilidade dos
egressos é um indicador de sucesso da universidade, pois mede a
capacidade de o mercado absorver e ver valor naquela mão de
obra”, acredita Anderson Pereira, da Universia. Ele defende que as
instituições precisam acompanhar o estudante também após a
formatura, funcionando como plataforma de apoio
permanente.
Walter Paulo Filho, diretor-geral das Faculdades Integradas da
União Educacional do Planalto Central (Faciplac), tem investido
nisso. “A verdadeira educação superior vai além de conferir um
diploma, tem caráter de inserção. Nós temos um setor de
acompanhamento de egressos e empregabilidade, fazemos contato com
todos os alunos após a formatura e continuamos em contato até ter
feedback positivo”, conta.
Em baixa
A única área analisada pelo índice
do Semesp que não teve saldo positivo de empregos foi a de
engenharias, sinal de que os setores de infraestrutura e indústria
ainda precisam se recuperar da crise. “Algumas áreas que formaram
muita gente nos últimos anos estão em situação mais crítica. No
caso da engenharia, além disso, há o problema da crise das
empreiteiras, da indústria... As engenharias civil, de produção,
mecânica e química perderam bastante em número de vagas”, afirma
Rodrigo Capelato. Economista pós-graduado em tecnologia da
informação (TI), ele cita ainda o curso superior em logística como
outro prejudicado.
Egressos de cursos de grau tecnológo também costumam ter
dificuldade para se inserir no mercado, porque existe preconceito
contra esse tipo de formação. “O mercado não compreende uma série
de carreiras de grau tecnológico que, no mundo inteiro, estão em
alta. São formações com duração um pouco menor, mas bastante foco
no mercado de trabalho”, esclarece.
Em alta
Para graduados em algumas áreas, o
cenário está melhor, mas não porque o setor ande bem. “A única das
carreiras que conseguiu se safar em termos de volume de emprego é
administração, porque é um ramo em que os recém-formados têm ido
para vagas que, geralmente, não eram ocupadas por alguém com nível
superior, como auxiliar de escritório ou de
administração.”
Fenômeno semelhante se passa no direito. “Muitos ocupam funções de
auxiliar de serviços jurídicos e despachante de fórum, que poderiam
ser executadas por alguém de nível médio”, afirma. Quem se forma em
cursos de saúde (como medicina, enfermagem, nutrição e
fisioterapia) costuma conseguir emprego com mais tranquilidade. “É
uma área que sempre emprega”, explica.
A psicologia também teria ganhado espaço. “Está se tornando mais
popular a procura por tratamento clínico, com planos de saúde
aceitando e mais pessoas querendo se entender. Na outra ponta, as
empresas têm procurado psicólogos organizacionais”, informa. Assim
como a saúde, a educação continua contratando, mas não
necessariamente com bons salários.
“Os professores, pessoal das licenciaturas, não estão sofrendo
muito com o desemprego porque há menos gente querendo trabalhar com
isso, já que a carreira é muito desvalorizada e o mercado é ruim.”
Já a tecnologia da informação é a única área citada pelo diretor do
Semesp que, de fato, está crescendo. “Os graduados nesse curso têm
boa entrada no mercado, que está aquecido, principalmente por causa
dos aplicativos”.
Além da empregabilidade, o
empreendedorismo e o compromisso social são grandes demandas da
comunidade universitária, segundo a pesquisa do Instituto Ipsos, em
que 41% opinam que as instituições de ensino precisam estimular
mais o espírito empreendedor. Essa necessidade fica clara quando se
olha para o percentual de universitários que pretendem empreender
no país: 7%.
“A universidade é muito focada na preparação do aluno para o
mercado de trabalho, mas se restringindo ao emprego formal, e não
podemos ficar apenas nisso”, observa Anderson Pereira, diretor da
Universia no Brasil. É necessário munir os alunos de competências
do século 21 e prepará-los para um cenário de mudanças constantes e
intensas, em que o empreendedorismo ganha destaque.
Pesquisa da Deloitte com mais de 10
mil pessoas de 36 países diagnosticou que as gerações Y e Z
(nascidos de 1980 a 2010) se sentem despreparadas para as mudanças
da Indústria 4.0. Então, as instituições de ensino precisam
ajudá-las a se adaptar a isso. Daniel Castanho, presidente do grupo
empresarial Ânima Educação, defende que as universidades devem se
reinventar totalmente para acompanhar as revoluções, modernizando
currículos, os assuntos tratados e o modo de ensinar.
“Estamos falando numa era do pós-emprego. Segundo a consultoria
McKinsey, nos próximos 10 anos, 40% dos empregos será freelancer.
Ou seja, não dá mais para preparar o aluno só para encontrar
emprego formal”, alerta. “Até pouco tempo atrás, o simples fato de
ter diploma já aumentava seu salário em duas ou três vezes. Assim,
as universidades, públicas e privadas, acabaram não tendo motivação
para se reinventar, continuaram formando do mesmo jeito. Esse foi o
problema”, aponta.
Criei meu emprego
O dono da clínica veterinária Mundo
Zoo acredita que ser empresário é mais difícil do que atuar como
empregado pela carga de responsabilidade. “Como proprietário, a
gente passa por situações inesperadas. Já o funcionário tem o
salário garantido no fim do mês”, compara. A parte positiva está na
autonomia.
“Durante a graduação, fiz dois cursos de empreendedorismo dentro da
faculdade, o que ajudou”, lembra. Para Guilherme, independentemente
do caminho escolhido, o sucesso depende de esforço próprio. “A
partir do momento em que você é um bom profissional, seja abrindo
uma empresa seja trabalhando para os outros, tem carreira e emprego
garantidos. O problema é que tem muita gente despreparada”,
opina.
O arquiteto Fred Edson Gomes, 30
anos, está entre a pequena parcela de pessoas que saem da
instituição de ensino superior pensando em empreender. Hoje, é
sócio de um engenheiro civil numa empresa de obras, a Concrete. “Eu
tinha facilidade de trabalhar por conta própria, de ir atrás de
clientes, então preferi esse caminho.”
Na hora de contratar, ele admite que existe certa resistência com
recém-formados. “Quando você pega uma pessoa com experiência, a
responsabilidade do gestor se alivia, porque o serviço terá
andamento mais tranquilo, sem precisar ficar em cima”, compara. Ele
observa, porém, que treinar estagiários para efetivá-los após a
formatura é interessante, pois eles serão moldados antes disso. Só
que isso requer investimento. “Passo três meses só ensinando o
estagiário”, diz.
Darlene Carvalho, gerente de
Atendimento Nacional do Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios),
observa que essa fase é um dos maiores atalhos para a
empregabilidade. Tanto porque experiências como estagiário são
levadas em conta durante seleções quanto porque é possível ser
efetivado pelo empregador após se formar.
“Hoje, há 8 milhões de estudantes no ensino superior, dos quais
apenas 740 mil, o que equivale a 9%, estagiam. É um número muito
baixo”, destaca. Para ela, existe uma relação entre a pequena fatia
de universitários estagiando e a dificuldade de conseguir emprego
entre recém-formados. Afinal, o estágio é uma porta para o mercado.
“Eu mesma entrei no Nube como estagiária, há 17 anos. Hoje, estou
num cargo de gerência”, conta. Para Darlene, falta abertura do
mercado, principalmente das pequenas e médias empresas, para
contratar profissionais em formação.
Passo a passo da inserção
profissional
Confira dicas de Felipe Callbuci,
diretor-geral do site de buscas de empregos Indeed no Brasil;
Marcelo Haengenbeek, economista e CEO da Apponte, empresa de
tecnologia detentora de um aplicativo de busca de empregos; e
Darlene Carvalho, gerente de Atendimento Nacional do Nube (Núcleo
Brasileiro de Estágios):
Eduarda Esposito*
Ana Paula Lisboa
- Descubra quem é o avaliador,
estude essa pessoa (procure no Google e no LinkedIn) e se mostre
interessado. Isso te ajudará a saber como se portar na hora da
entrevista.
- Chegue para fazer a entrevista no
horário marcado.
- Mostre que você conhece a empresa
durante a entrevista, comentando sobre ela. Para se inteirar,
pesquise sobre a organização na internet, veja qual produto ou ramo
em que a instituição atua.
- Use roupa adequada ao perfil da
empresa. Para descobrir isso, procure se informar ou perguntar
sobre que tipo de vestimenta é usada para o trabalho por lá.
Piercing e tatuagem podem pegar mal dependendo da organização —
para um local mais formal, seria interessante tirar e cobrir. Já
para ambientes mais informais, como agências de comunicação, isso
não é impeditivo.
- Esteja atualizado com as notícias,
saiba o que está acontecendo, de modo geral, no Brasil e no mundo.
Caso o recrutador comente algum assunto de atualidades, assim, você
não fica por fora.
- Sempre seja sincero sobre suas
qualificações profissionais para não ter problemas; os avaliadores,
em muitos casos, sabem quando os candidatos estão mentindo. Além
disso, a mentira pode ser descoberta lá na frente.
- Não tenha medo de falar de si. É
positivo falar sobre si e suas características profissionais, se é
focado, tem liderança, sabe trabalhar em conjunto e é comunicativo
— mas demonstrando com exemplos reais, em vez de se gabando.
- Demonstre habilidades
comportamentais importantes durante a entrevista, como iniciativa
(falando com entusiasmo e comentando situações em que você foi
proativo) e facilidade de relacionamento (contando sobre
negociações em que teve sucesso), por exemplo.
- Mostre ambição e vontade de
crescer dentro da empresa durante a entrevista, diga onde espera
chegar. Ser ambicioso geralmente é positivo, desde que não se torne
ganância. Mas isso varia com o perfil da empresa, ou seja, é
preciso pesquisar o plano de carreira, saber se a firma incentiva
por resultados ou tem um perfil mais neutro com salário fixo.
- Destaque seu perfil de
recém-formado com um viés positivo em comparação com pessoas que
estão há mais tempo no mercado, mostrando que chegará à empresa sem
vícios de mercado, disposto a aprender a se encaixar no padrão da
firma.
- Valorize os estágios que você fez
durante a entrevista. Vale muito, pois são experiências reais.
Outras vivências (como intercambio, participação em grêmio
acadêmico, atlética, empresa júnior e outros projetos) também
merecem ser mencionadas.
- Evite usar gírias durante a
conversa. Mas procure saber sobre a empresa e identifique se o
perfil dela é mais formal ou informal, tendo em vista que algumas
empresas com perfil mais jovem podem aceitar esse tipo de
linguagem.
- Invista no português! Muitas
empresas cobram provas escritas ou redações durante as seleções.
Nesse caso, erros gramaticais e falta de nexo no texto podem ser o
que o deixará de fora.
- Evite gestos que mostram que você
está ansioso — como balançar pernas, batucar, tamborilar com os
dedos, roer as unhas, se remexer desnecessariamente na
cadeira.
- Seja sempre educado durante a
entrevista, dê “bom dia”, “boa noite”, diga “obrigado” e “por
favor”. Isso causa boa impressão. Seja gentil, olhe nos olhos, dê
aperto de mão firme, fique atento quando o entrevistador estiver
falando, tudo isso causa uma boa impressão.
- Seja direto nas respostas dadas ao
avaliador, não demore para dizer o que é importante. Dá para tomar
mais tempo em uma resposta caso você siga uma linha lógica, sem
enrolações. Lembre-se: o tempo de entrevista é curto. Não fale nem
demais nem de menos.
- Conte ao entrevistador o real
motivo pelo qual você se formou no seu curso, se foi por vontade
própria, escolha da família, interesse financeiro... É bom dizer a
razão porque mostra como o candidato pensa, a forma como tomou uma
decisão muito importante na vida, se foi impulsiva, se foi
analisada. É importante encaixar uma história com sentido.
- Se, mesmo com tudo isso, você não
conseguir sucesso nos processos seletivos, reveja as áreas em que
está buscando trabalho, se tem aptidão para trabalhar com aquilo,
pois é difícil conseguir bons resultados em algo de que você não
gosta.