Há muitas coisas que você já consegue
resolver pelo seu smartphone: pedir comida, reservar um quarto de
hotel, solicitar um táxi, pagar contas, bem, há um aplicativo para
quase toda nossa inquietação e necessidade hoje em dia. No entanto,
há ainda uma indústria que pouco explorou as vantagens oferecidas
pelo nosso pacote de dados móvel: a de seguros. Mas essa realidade
está mudando. As chamadas insurtechs têm
despontado como as grandes promessas da vez, seguindo um caminho
parecido ao das fintechs que, se há cerca de cinco anos levantavam
olhares desconfiados, hoje movimentam bilhões e incomodam grandes
bancos.
Segundo estudo da consultoria e
corretora de seguros Aon, lançado em novembro do ano passado, o
mercado global de insurtechs é representado por 550 startups e já
movimentou US$ 14 bilhões em investimento. No Brasil, há 40
startups dedicadas ao mercado de seguros, segundo levantamento
do Comitê das
Insurtechs da camara-e.net.
Para Gustavo Zobaran, coordenador do
Comitê, dado o potencial de disrupção em um mercado ainda
conservador, o número é baixo, mas tende a mudar rapidamente. "As
próprias fintechs têm ajudado as insurtechs nesse crescimento. Elas
abriram e começaram a traçar uma trilha, cortaram muito do mato
alto para as insurtechs", avalia Zobaran. Para ele, muitas
iniciativas das fintechs que venham para resolver as dores de
clientes poderiam, com as devidas adaptações, atenderem o mercado
de seguros. "Se elas deram uma olhada para o lado, elas acertam em
cheio o mercado de insurtechs, porque esses dois mundos
têm muito a ver", indica.
Criado no ano passado
pela Câmara Brasileira de Comércio
Eletrônico (camara-e.net), o Comitê das
Insurtechs tem mapeado o ecossistema das jovens seguradoras
digitais no País. Agora, a iniciativa prepara um trabalho
qualitativo dessas startups. O objetivo é entender como e para quem
operam essas iniciativas, suas tecnologias e que dores se propõem a
resolver.
Personalização
Por mais nascente que seja o mercado
das insurtechs, novas empresas dedicadas ao mercado de seguros já
começam a moldar a indústria. Se antes elas eram vista como uma
força disruptiva, hoje, endereçam inovação através do setor
adotando novas tecnologias como machine
learning, Internet das
Coisas, e analytics para
entregar serviços personalizados. Big
data no varejo: A ContaAzul te ensina como tirar vantagem desse
recurso
E no engessado mercado de seguros, a
oferta de serviços personalizados pode brilhar nos olhos do
consumidor, pois, na maioria das vezes, resulta em apólices mais
baratas e ágeis de serem contratadas. A startup
brasileira Thinkseg é um exemplo disso.
A empresa desenvolveu tecnologia para entregar seguros de veículos
que levam em consideração o comportamento do próprio motorista. O
aplicativo Thinkseg consegue capturar e transmitir dados da
condução do carro por comunicação telemática. Esses dados são
avaliados sob certos parâmetros e no final de cada mês, o
aplicativo mostra os resultados obtidos em relação ao jeito da
pessoa dirigir. Uma pontuação ilustrada por meio de estrelas vai
gerar descontos na hora da renovação do seguro, podendo chegar a
40% de desconto. Tudo é feito pelo celular. "É um novo formato de
seguro, por meio do qual o bom condutor é premiado, não apenas na
renovação do seguro, mas todos os dias, por meio da sua
tecnologia pay as you use (pague conforme você
usa)", explica Andre Gregori, fundador e CEO da Thinkseg.
A Thinkseg se lançou no mercado há
pouco mais de um ano. De lá para cá, agregou novos produtos em seu
portfólio que hoje compreende o seguro de automóvel e de moto, o de
assistência que inclui serviços para residência, um seguro voltado
para animais de estimação e o Thinkseg Corporate, voltado às médias
e grandes empresas. Toda a contratação de seguros é feito via
mobile ou pelo site da companhia. "Pelo smartphone, é possível
contratar um seguro, o que traz praticidade e transparência. É
nosso jeito de tentar mudar a forma como o cliente vê esse
mercado", avalia Gregori.
Para o usuário, basta baixar o
aplicativo e assinar um dos planos que a Thinkseg oferece. Mas para
entregar inovações até a ponta final, no caso, o usuário, a startup
desenvolveu um modelo de negócio que atravessa outros personagens
da vertical. Gregori explica que a companhia é, na verdade, um
marketplace móvel de seguros que conecta clientes, corretores e
seguradoras. "No momento, está em andamento as integrações do
marketplace com diferentes seguradoras. Do lado do cliente, todas
as etapas de qualquer contratação podem ser acompanhadas no
celular. Do lado do corretor, ele vai gerenciar os clientes
indicados por meio de uma carteira própria dele. Esse modelo que,
ao mesmo tempo, é inovador e muito conveniente ao usuário é também
lucrativo para o corretor", ressalta.
Desmistificando apólices com
Inteligência Artificial
A Kakau
Seguros também tem encontrado nas tecnologias
emergentes uma aliada para entregar seguros para um novo tipo de
consumidor. A insurtech desenvolveu soluções de machine learning
que habilitam uma plataforma de chatbot com linguagem natural e
também análise preditiva. "Aplicamos modelos matemáticos e de
machine learning para previsões de chances de sinistro de nossas
carteiras", explica Henrique Volpi, cofundador da Kakau Seguros. A
empresa também atua em parceria com corretoras e seguradoras e seus
serviços já cobrem todo o território nacional.
Um dos primeiros contatos de novos e
potenciais clientes da Kakau Seguros é através da assistente
virtual Anna, um bot que direciona o usuário para o Facebook
Messenger. Por meio do mensageiro, é possível tirar as principais
dúvidas na contratação, incluindo informações sobre abertura de
sinistro e solicitar assistências. Para a empresa, contar com uma
assistente virtual inteligente ajuda a equipe concentrar os
esforços em evoluir a plataforma. "Nosso público é majoritariamente
de mulheres millenials, o que está em linha com as
nossas premissas iniciais. Elas mostram muito interesse em
informação e educação sobre seguros", conta Volpi.
A insurtech oferece planos para
assegurar casas e apartamentos, com mensalidades a partir de R$ 19.
Outra vantagem é a possibilidade de pausar a assinatura a qualquer
momento. Toda a contratação é feita por meio do site da seguradora.
Segundo Volpi, a startup agora se prepara para lançar outros
coberturas: seguros para smartphones, bicicletas e
automóveis.
Um "Netflix" dos
seguros
Entre os muitos desafios do mercado de
seguros está a própria conscientização. Trata-se ainda de um
mercado que pouco conversa com o grande público. Para Gustavo
Zobaran, do Comitê de Insurtechs, é um mercado que precisa se
reinventar. "O benchmarking para uma evolução digital não são as
empresas seguradoras, são empresas de serviço que vieram para
quebrar o status quo de outros mercados, como um Netflix, um
Spotify, um Uber. Esse público já se relaciona muito bem com esses
serviços em termos de experiência e se não forem melhor, devem ser
iguais para qualquer outro serviço, senão o usuário não vai
embarcar nesta experiência. O mercado segurador precisa que essas
novas iniciativas estejam ligadas com o que ele propõe. É um viés
muito comportamental", avalia Zobaran.
Da mesma forma que aconteceu com as
fintechs, onde bancos passaram a se associar às novas empresas, as
insurtechs também se aproximam de grandes seguradoras em um
movimento visto como natural pelo mercado. "As seguradoras estão
atentas à influência da tecnologia na distribuição de seguros, ao
desenvolvimento de mecanismos internos para testar modelos
digitais, e ao movimento da evolução das insurtechs", ressalta
Andre Gregori, da Thinkseg. Segundo o CEO, a startup fechou
parcerias com seguradoras brasileiras e internacionais com
operações no Brasil.
Os obstáculos com burocracias também
minam o mercado. Mas há iniciativas que buscam endereçar tais
desafios. A Superintendência de Seguros Privados
(Susep), órgão que regulamenta o setor, informou que
montou um grupo de trabalho para entender como as insurtechs
funcionam e como será possível flexibilizar as regras para que o
mercado se desenvolva no país.
Mesmo diante de burocracias, a
perspectiva para as insurtechs é boa, tendo em vista que é um
mercado mais generoso em termos de investimento e pouco explorado.
"Existem várias oportunidades, desde a criação de novas seguradoras
ou iniciativas que possam resolver soluções de telemetria, como
pulseiras que coletam dados e índices glicêmico de pacientes e
encaminham para as seguradoras", indica Zobaran. "Existem muitas e
diferentes oportunidades e quem chegar na frente vai beber a água
limpa", completa.