Série de
ações estratégicas propostas por Dilma Rousseff após manifestações
de 2013 'bateu na trave', admite Gilberto
Carvalho
No
dia 24 de junho do ano passado, a presidenta Dilma Rousseff usou a
rede de rádio e televisão para apresentar cinco pactos em resposta
à onda de protestos no País: responsabilidade fiscal e controle da
inflação; investimentos em saúde e contratação de médicos
estrangeiros; destinação de 100% dos royalties do petróleo para a
educação; recursos para mobilidade urbana e a convocação de uma
Constituinte sobre reforma política.
Um
ano depois, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da
República, Gilberto Carvalho, avalia que o principal pacto – o da
reforma política – “bateu na trave”. Após desistir da convocação de
uma Constituinte para a reforma política, a presidenta enviou
mensagem ao Congresso Nacional com sugestões de mudanças no sistema
eleitoral, como financiamento de campanha, sistema de eleição de
deputados e novo regime de coligações. “Não houve nenhum debate lá
dentro mais acalorado, simplesmente não foi adiante”, criticou o
ministro.
Questionado se faltou pressão por parte do
governo para efetivar a proposta, ele disse: “Talvez pudéssemos ter
pressionado mais. Eu posso dizer que os partidos mais à esquerda
poderiam ter feito mais militância nisso, eu acho que faltou.
Faltou um pouco mais de empenho dos partidos”, disse
Carvalho.
Para
ele, o pacto sobre responsabilidade fiscal não gerou ações
concretas. Já os pactos da saúde, da mobilidade e da educação foram
parcialmente cumpridos. Na saúde, houve a concretização do Programa
Mais Médicos, que já vinha sendo formulado pelo governo. No caso da
educação, foi aprovada a destinação de 75% dos royalties do
petróleo e mais 50% do Fundo Social do Pré-Sal. Em relação à
mobilidade, foi feito investimento de R$ 50 bilhões, destinados
sobretudo para as sedes da Copa do Mundo. Para o ministro, os dois
últimos pactos devem começar a mostrar resultados nos próximos
anos.
Especialistas e movimentos sociais, por outro
lado, criticam o que consideram a não execução dos pactos. O
cientista político Leonardo Barreto avalia que os Três Poderes
deveriam ter implementado uma agenda de reformas para responder à
sociedade e retomar o diálogo. Essa agenda, avalia, deveria conter
ações contra a impunidade e que garantissem reforma política, a
prioridade de gastos com serviços públicos e mais transparência das
ações do Estado.
“Para
transformar isso em uma plataforma reformista, você tem que se
comprometer com certas coisas que vão contra o status quo da
própria classe política”. O estudioso considera que nenhum governo
ou político conseguiu responder àquele processo e que a população
voltou para casa sem as conquistas pretendidas. “O que me preocupa
é a nossa incapacidade de achar soluções, e os problemas vão se
acumulando. E hoje eu vejo o país muito imobilizado, as próprias
lideranças políticas não mostram muita força”, critica
Barreto.
O
Movimento Passe Livre (MPL), que coordenou em junho do ano passado
as manifestações em defesa da redução da tarifa do transporte
público em São Paulo, também critica a postura do governo. “A
presidenta fez uma mesa para ouvir o MPL, mas não tomou nenhuma
atitude de garantir o direito ao transporte das pessoas”, afirmou
Lucas Oliveira, um dos integrantes do movimento. Por outro lado, o
MPL contabiliza vitórias. Além da redução das tarifas, o ativista
destaca a aprovação da Emenda Constitucional nº 90, que dá nova
redação ao Artigo 6º da Constituição Federal e inclui o transporte
como direito social.
Outras conquistas também foram obtidas pelos
ativistas, como a retirada de pauta da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) nº 37, que retiraria o poder de investigação do
Ministério Público, e o projeto que ficou conhecido como “cura
gay”.
Sandra Quintela, integrante do Instituto
Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs) e da Articulação
Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop), aponta como vitória
desse ano de lutas a divulgação das violações vivenciadas no
contexto de preparação para a Copa do Mundo, por meio de relatórios
e atos organizados pelos movimentos locais e pela Ancop, bem como a
conquista de moradia e a diminuição das remoções, em cidades como
Fortaleza.
Do
ponto de vista das mobilizações, o MPL avalia que junho permitiu o
crescimento das lutas urbanas, expressas nas ocupações, e também o
diálogo entre trabalhadores do transporte público e os usuários do
transporte.
O
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) também é otimista ao
analisar os protestos. Para o coordenador nacional do MTST,
Guilherme Boulos, os protestos de junho abriram uma nova conjuntura
para as lutas sociais do país.“As mobilizações de junho
reabilitaram essa legitimidade da luta social para a consciência
popular. Até porque as pessoas viram que a massa foi para rua e a
reivindicação foi alcançada: a tarifa baixou no país
todo”.
Ele
conta que, desde junho do ano passado, “a quantidade não só de
ocupações de terra, mas de greves e de mobilizações populares que
ocorreram, foi muito mais expressiva que no período anterior. Isso
é importante, é um avanço, demonstra um despertar dos trabalhadores
de forma mais organizada”.