Estiagem de 2022 reforçou a
importância do auxílio para agricultura da região
Quem trabalha com agricultura sabe
que a atividade é de risco, afinal, é preciso contar com condições
climáticas favoráveis para a safra se desenvolver e vingar. Torcer
e rezar para que intempéries não prejudiquem as plantações até
valem, mas não são suficientes. Por isso, o agricultor José
Leonardo Bassanesi resolveu, há cerca de 15 anos,
contratar seguro agrícola para a produção de uva na
localidade de São Gotardo de Vila Seca.
Antes de aderir, ele lembra ter
perdido safras praticamente inteiras por causa de geada e granizo.
O investimento com tratamento e mão de obra é muito alto, segundo
ele, e o melhor é o antigo mandamento, de prevenir em vez de
remediar.
— O seguro te dá uma tranquilidade.
Na agricultura, a margem de lucro é pequena e geada e granizo
acontecem seguido na nossa região. O cara fica mais tranquilo. Se
acontece, tu tem uma garantia daquilo que tu tá investindo —
entende o produtor, que acionou o seguro pela última vez na
colheita de 2020 devido à geada.
Além de proteger os parreirais,
Bassanesi segurou a propriedade, o que inclui maquinário e casa. As
possibilidades fazem parte do seguro rural, que inclui ainda outras
modalidades, como seguro dos animais e de vida do próprio
agricultor. O produtor pode escolher qual seguro contratar e de
qual sinistro se proteger, explica o corretor André
Moschen.
No ramo de seguro rural desde que
foi implantado no Brasil, há aproximadamente 20 anos, ele percebe
um amadurecimento dos produtores com a percepção da importância da
ferramenta para proteção das plantações.
— Eles costumam contratar em cima
dos maiores riscos, daquilo que querem proteger. Todo ano tem
granizo, geada nem tanto. Tem anos que são mais brandos e a
intensidade é uma loteria, essa é a incerteza. O produtor sabe que
sempre está em risco. Então, ele compra o seguro prevendo essa
incerteza — diz o profissional, que tem mais de 2 mil clientes ao
longo do ano.
Conforme Moschen, o custo do seguro
é desenhado por cultura e o investimento do produtor vai depender
do que ele contrata. Se não tiver seguro para geada, por exemplo,
fica mais barato. Na região, os seguros mais contratados são para
uva e maçã. Em seguida, tem as frutas de caroço.
A estiagem que afetou o Estado
nesta safra não chegou a prejudicar a produção de uva de Bassanesi.
Os 12 hectares da variedade bordô renderam uma safra média com
ótima qualidade. O peso dos cachos, conforme ele, foi razoável e a
fruta teve boa graduação. Apesar disso, ele garante que contrataria
seguro para estiagem se houvesse para as videiras:
— Não tem água na maioria das
plantações, é um solo em que não dá para fazer açude em muitos
casos, então eu contrataria.
O seguro para estiagem, conforme
André Moschen, está disponível para lavouras de grãos, como soja e
milho: faz parte do chamado seguro multirrisco, que inclui outros
sinistros como geada, granizo e vento. Neste tipo de seguro,
qualquer condição será coberta, porém, não atende outras
culturas.
— A fruticultura sofre com a
estiagem, mas numa proporção muito menor que os grãos — acrescenta
Moschen.
3,2 mil beneficiários na região
Caxias do Sul e algumas das principais
cidades produtoras de árvores frutíferas em seu entorno, casos de
Flores da Cunha, Bento Gonçalves, Farroupilha e Garibaldi, somaram
mais de 3,2 mil beneficiários de seguros agrícolas em 2021. Os
dados foram repassados pelo Departamento de Gestão de Riscos da
Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Flores da Cunha lidera esse ranking
atualmente com 996 contratos deste tipo, sendo que a uva concentra
a maior parte dos casos. Bento Gonçalves é a segunda cidade da
região que mais busca o recurso de prevenção, com 731 apólices,
também puxada pela produção da mesma fruta. Na sequência, aparece
Caxias do Sul com 686 produtores, com destaque também para maçã.
Farroupilha se destaca nas contratações de seguros que chegam a 610
de variedades semelhantes às demais cidades do entorno.
Pedro Augusto Loyola, diretor do
departamento responsável pelo tema no Mapa, destaca a evolução do
setor na última década, possibilitando que cada vez mais produtores
rurais tenham uma garantia para não ter o trabalho de um ano
inteiro afetado, e às vezes até perdido, por eventos adversos.
Os números compilados pelo governo
federal mostram que a procura pelo recurso teve um leve crescimento
nos últimos 10 anos. O total de beneficiários em 2011 era de 3.139
e chega a 3.243 no último balanço consolidado, que é o de
2021.
Apesar do percentual de crescimento
pequeno, na casa de 3%, o que se percebe é a diversificação maior
de culturas que passaram a contratar o mecanismo de proteção.
E os relatos dos próprios
agricultores ouvidos pela reportagem mostram que há espaço para
este ramo dos seguros agrícolas crescer ainda mais na fruticultura.
É que algumas coberturas ainda não são contempladas por
seguradoras, casos da estiagem. De acordo com Loyola, uma das
justificativas é de que, em geral, seguros multirriscos costumam
ser mais caros e, com isso, menos atrativos no mercado.
Para se ter mais um termômetro de
quanto o seguro movimenta de recursos na região, a Sicredi
Pioneira, cooperativa que abrange 21 municípios da região,
contratou mais de R$ 2,4 milhões em prêmios para 2021 em uma área
segurada total avaliada em mais de R$ 25,8 milhões. O número de 207
apólices do período se manteve praticamente estável em relação a
2020. Os sinistros indenizados nestes últimos dois anos somaram R$
2,2 milhões.
Proagro tem alocações pela
União
Produtores que não têm seguro
agrícola podem aderir ao Programa de Garantia da Atividade
Agropecuária (Proagro). Diferente do seguro privado, ele é custeado
por recursos alocados pela União e dos provenientes da contribuição
que o produtor rural paga.
Engenheira agrônoma e gerente
regional da Emater, Sandra Dalmina explica que o Proagro é um
programa de garantia vinculado às operações de crédito com
orientação do Banco Central. Para ser enquadrado, o item financiado
precisa estar zoneado, e quem faz esse zoneamento é o governo
federal.
— Quero plantar abacaxi em Caxias,
mas não tem zoneamento para abacaxi em Caxias, então não posso
fazer Proagro — exemplifica Sandra.
A exceção, segundo ela, são as
lavouras irrigadas que ficam dispensadas de zoneamento.
Conforme a gerente da Emater, o
adicional do Proagro varia de 2% a 8,5%, dependendo da cultura.
Enquanto o seguro privado assegura a receita para eventos
específicos, o Proagro tem cobertura mais ampla.
— Se a cultura está em plena
floração e tem uma chuva excessiva, o Proagro vai assegurar —
completa.
Na região de Caxias, 1.447
solicitações de Proagro foram feitas neste ano até agora: desse
número, 825 foram pedidos para milho, 107 para soja e 515 para
outras culturas. Em 2021, foram 899 no total e em 2020,
2.794.
“Se não fosse pelo seguro, estaria
quebrado”
Quando começou a plantar, há 30
anos, o clima não chegava a ser um problema para o produtor Jorge
Leite. Porém, de 15 anos para cá, as chuvas de granizo passaram a
ser frequentes e ele resolveu investir em um seguro para proteger
os pomares de pêssego, maçã e caqui na propriedade que mantém em
Vila Oliva.
— Todo ano tem que acionar por
causa de granizo, até duas, três vezes por ano — diz.
No ano passado, além do granizo, a
plantação foi afetada pelo vendaval que atingiu o distrito em
setembro. Porém, ele recebeu apenas pela safra do pêssego perdida,
que já tinha fruta no pé. Foram R$ 142 mil. Para o caqui e a maçã,
que estavam na florada, o seguro não cobriu as perdas. Se já
tivesse fruta, o valor a receber seria de cerca de R$ 800 mil.
Leite sabia da cobertura nesses casos.
— Apesar disso, vale a pena fazer.
Se não fosse pelo seguro, estaria quebrado, mas quebrado de vez,
porque todo ano dá granizo — destaca.
Quando uma plantação é afetada, o
agricultor aciona o seguro e uma perícia é feita. O valor é pago
aproximadamente 30 dias após o fim da colheita.
Quanto mais seguro, melhor
A família de Charles Venturin
produz uvas desde 1944, quando o nonno Severino Martine Venturin
(in memoriam) comprou a terra na localidade de Monte Bérico. Desde
então, sempre as intempéries os acompanharam, todos os anos,
segundo os relatos mais antigos que chegaram ao neto, que hoje
administra os sete hectares que produzem cerca de 120 toneladas de
uvas, entre as de mesa finas e para vinhos. Segundo Venturin, é
difícil ter um ano sem imprevistos. O que mudou dos tempos do nonno
para cá é que existe o seguro agrícola, que para a produção de uva
vem sendo ofertado há cerca de 20 anos. O produtor contrata o
mecanismo de prevenção há pelo menos uma década.
— O que me motivou, assim como
outros produtores, é ter sofrido perdas por conta de um granizo
muito forte. Depois nunca mais deixamos de fazer — relembra
Venturin.
O modelo que contrata cobre
prejuízos com chuva de pedra e ventos fortes. Ele não pegou a
cobertura contra a geada porque o custo se tornaria elevado para o
custeio de produção, e também porque investiu em um sistema de
dispersão de geada com mecanismos de irrigação em 2016, após ter
perdas de 70% na colheita em função do fenômeno
climático.
Mas mesmo com todos esses
investimentos para se sentir um pouco menos inseguro, Venturin teve
uma nova surpresa neste ano. A estiagem provocou uma quebra de
safra entre 25% e 30% para as variedades viníferas que não têm
irrigação. O açude nunca chegou a nível tão baixo. Foi então que
foi buscar informações sobre a possibilidade de incluir no seu
seguro uma prevenção para as perdas provocadas pela falta de água.
Foi aí que descobriu que essa modalidade ainda não está prevista
para a uva.
— Como é uma coisa que nunca tinha
acontecido de forma tão drástica, pois só lembro de algo semelhante
em 2005, não imaginava que não teria. Tem seguro para tanta coisa,
será que não poderia ter para estiagem? Se tivesse e fosse com um
valor mais acessível, como o do granizo, eu faria, pois é um evento
que nos últimos anos tem se intensificado no Rio Grande do Sul —
destaca Venturin.
Na opinião do produtor rural,
quanto mais opções e incentivos para contratações de seguros, mais
o setor vai se desenvolver.
— Tem anos que ocorrem vários
eventos ao mesmo tempo e que estragam o trabalho de nove meses que
prepara a colheita. Hoje eu jamais trabalharia sem uma proteção
mínima para pelo menos cobrir os custos. Já tive sinistros em
produções seguradas que foram bem avaliados. É uma compensação, mas
é claro que nunca vai se comparar com uma boa colheita —
aponta.
O que é o seguro rural
É um dos mais importantes
instrumentos de política agrícola, por permitir ao produtor
proteger-se contra perdas decorrentes principalmente de fenômenos
climáticos adversos. Contudo, é mais abrangente, cobrindo não só a
atividade agrícola, mas também a atividade pecuária, o patrimônio
do produtor rural, seus produtos, o crédito para comercialização
desses produtos, além do seguro de vida dos produtores. O objetivo
maior do seguro rural é oferecer coberturas que, ao mesmo tempo,
atendam ao produtor e à sua produção, à sua família, à geração de
garantias a seus financiadores, investidores, parceiros de
negócios, todos interessados na maior diluição possível dos riscos,
pela combinação dos diversos ramos de seguro.
Quais são as
modalidades
Seguro agrícola, seguro pecuário,
seguro aquícola, seguro de benfeitorias e produtos agropecuários,
seguro de penhor rural, seguro de florestas, seguro de vida do
produtor rural e seguro de cédula do produto rural.
O que cobre cada uma das
modalidades
- Seguro agrícola: cobre as explorações
agrícolas contra perdas decorrentes principalmente de fenômenos
meteorológicos. Cobre basicamente a vida da planta, desde sua
emergência até a colheita, contra a maioria dos riscos de origem
externa, tais como incêndio e raio, tromba d’água, ventos fortes,
granizo, geada, chuvas excessivas, seca e variação excessiva de
temperatura.
- Seguro pecuário: cobre os danos diretos ou
indiretos ao animal destinado ao consumo e/ou produção, englobando
as fases de cria, recria e engorda, bem como aos animais de
trabalho destinados a sela, trabalho por tração e transporte no
manejo da fazenda. Os animais destinados à atividade reprodutiva
cuja finalidade seja, exclusivamente, o incremento e/ou melhoria de
plantéis daqueles animais mencionados no caput deste artigo estão
também enquadrados na modalidade de seguro pecuário.
- Seguro aquícola: garante indenização por
morte e/ou outros riscos inerentes à animais aquáticos (peixes,
crustáceos) em consequência de acidentes e doenças.
- Seguro de benfeitorias e produtos
agropecuários: cobre perdas e/ou danos causados aos
bens diretamente relacionados às atividades agrícola, pecuária,
aquícola ou florestal que não tenham sido oferecidos em garantia de
operações de crédito rural.
- Seguro de penhor rural: cobre perdas e/ou
danos causados aos bens diretamente relacionados às atividades
agrícola, pecuária, aquícola ou florestal que tenham sido
oferecidos em garantia de operações de crédito rural.
- Seguro de florestas: garante pagamento de
indenização pelos prejuízos causados nas florestas seguradas,
identificadas e caracterizadas na apólice, desde que tenham
decorrido diretamente de um ou mais riscos cobertos.
- Seguro de vida: destinado ao produtor rural,
devedor de crédito rural, e terá sua vigência limitada ao período
de financiamento, sendo que o beneficiário será o agente
financiador.
- Seguro de cédula do produto rural: garante ao
segurado o pagamento de indenização, na hipótese de comprovada
falta de cumprimento por parte do tomador, de obrigações
estabelecidas na CPR (cédula do produto rural).
Fonte: Superintendência de
Seguros Privados (Susep)