Tem-se dado muita ênfase aos
resultados do setor de seguros no primeiro trimestre de 2015.
Realmente, se compararmos a seco o crescimento da atividade com o
desempenho da economia nacional, não há como não ficar
impressionado. Crescer 22% quando o país cresceu negativamente não
é para qualquer um, ainda mais em época de grave crise
econômica.
Mas a conta não é tão simples
assim. Em primeiro lugar, não se pode perder de vista que o setor
de seguros é composto basicamente por atividades de apoio, quer
dizer, ele não é por si só um gerador direto de novos negócios e
aumento de riqueza.
Seguro não existe para ser vendido
feito picolé, geladeira ou automóvel. Ele só é vendido se antes
forem comercializados os picolés, as geladeiras e os automóveis,
cuja produção e venda geram a necessidade da proteção oferecida
pelo seguro.
Mesmo a previdência complementar
aberta e os planos de saúde privados só têm mercado se houver
geração de emprego e renda, sem o quê o crescimento destes produtos
não se sustenta.
A exceção são os títulos de
capitalização. Esses tendem a vender bem nas épocas de crise. A
razão disso é a “fezinha” do brasileiro no ganho fácil, num sorteio
de loteria, para afastar a penúria e transformar as vacas magras
num suculento churrasco, automóvel novo na garagem e até viagem de
férias para Orlando.
Para se entender o que aconteceu é
preciso compreender como a venda de seguros acontece e qual o ritmo
da operação no decorrer do ano. Seguro não é um bem tangível que a
pessoa usa quando tem vontade. Seguro é uma avença que baliza o
comportamento do segurado e da seguradora diante de determinadas
premissas previstas num contrato que regulamenta uma
contraprestação futura e aleatória.
Numa conta de padaria,
pode-se dizer que mais de 2/3 dos prêmios faturados no primeiro
trimestre dizem respeito a apólices contratadas ao longo do segundo
semestre do ano anterior e menos de 1/3 foram gerados em negócios
fechados nos primeiros três meses de 2015
Ninguém contrata seguro para riscos
passados. É a própria lei que veda esta prática. A garantia
oferecida pela seguradora se inicia às 24 horas do dia da
contratação da apólice e tem vigência normal, no Brasil, de um ano.
Assim, o desembolso da seguradora não é feito logo após a
contratação do seguro, mas ao longo de todo um ano, no qual, ainda
por cima, o sinistro pode ou não acontecer.
Da mesma forma, o pagamento do
seguro não costuma ser feito à vista, mas parcelado em várias
mensalidades, que podem chegar até a onze meses, depois de se
fechar o negócio. Neste desenho salta aos olhos que o faturamento
do primeiro trimestre do ano diz muito mais respeito a seguros
fechados ao longo do ano anterior do que a seguros novos, fechados
no período analisado.
Numa conta de padaria, pode-se
dizer que mais de 2/3 dos prêmios faturados no primeiro trimestre
dizem respeito a apólices contratadas ao longo do segundo semestre
do ano anterior e menos de 1/3 foram gerados em negócios fechados
nos primeiros três meses de 2015.
A crise não começou às 24 horas do
dia primeiro de janeiro de 2015. Ao contrário, ela vem ganhando
força ao longo do tempo. São os indicadores que apontam a queda da
atividade econômica que garantem que nos próximos meses o setor vai
sentir de forma mais dura a crise que já afeta grande parte da
economia nacional. Aí sim, os números realmente gerados no primeiro
trimestre estarão impactando o resultado das seguradoras, que com
certeza serão menores do que o resultado do quarto trimestre de
2014 e bem menores do que os números gerados no primeiro trimestre
do ano passado.
Por exemplo, se há uma queda de 20%
na venda de veículos novos, em algum momento as seguradoras vão
sentir a queda na arrecadação dos prêmios e haverá o descasamento
com o pagamento das indenizações, que continuarão sendo pagas
porque os veículos segurados têm cobertura por 12 meses. E a regra
vale para os outros seguros parcelados, mas não vale para os
seguros de vida e planos de saúde privados, que normalmente são
cobrados antecipadamente. Nestes casos a queda do faturamento será
imediata e deve ser sentida rapidamente.
Para a verificação do crescimento
real do setor seria necessário o desconto dos prêmios passados que
ainda estão sendo pagos. E esta conta não foi feita.