Uma família de Porto Alegre que havia
contratado um plano de saúde empresarial por meio de uma
microempresa teve o contrato cancelado pela operadora. A Justiça
entendeu que, apesar de terem contratado um plano empresarial, ele
funcionava na prática como um plano familiar e, por isso, não
poderia ter sido cancelado pela operadora. A decisão da 3ª Turma do
Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 2 de agosto, mandou a
operadora restabelecer o plano.
A decisão atinge diretamente os
micro e pequenos empresários, além de autônomos
com CNPJ ativo, que têm um plano contratado para si e
para seus dependentes por meio de sua empresa.
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Isso acontece porque os planos
empresariais podem ser cancelados pela operadora ou pelo cliente a
qualquer momento. As únicas exigências da ANS (Agência de
Saúde Suplementar) são que o contrato coletivo tenha ao menos
um ano de vigência e que o rompimento do contrato seja
notificado à outra parte com pelo menos 60 dias de antecedência,
sob pena de multa de R$ 80 mil.
Já os planos individuais ou
familiares seguem regras mais rígidas e só podem ser cancelados
pela operadora em caso de fraude ou de atraso de mais de 60
dias no pagamento.
Família não tem poder de
negociação
A ministra e relatora do caso no STJ,
Nancy Andrighi, afirmou que, apesar de "se tratar de contrato
coletivo empresarial, deve ser ressaltado que a pessoa jurídica
contratante é uma microempresa familiar e são apenas três os
beneficiários do contrato". Segundo ela, não é correto supor que
havia "duas pessoas jurídicas de igual força no mercado".
O voto da relatora foi seguido pelos
outros ministros integrantes da turma, e a decisão
pela restituição do plano foi unânime.
"O que a ministra está dizendo é que,
nessa situação específica, não existe diferença entre esse plano
familiar e um plano individual. Ele é, na verdade, um plano
familiar com ficção de coletivo", afirmou o advogado especializado
em saúde Marcos Patullo, do escritório Vilhena Silva
Advogados.
"Os planos empresariais podem ser
cancelados unilateralmente porque pressupõem que uma empresa pode
negociar em pé de igualdade com uma operadora de um plano. O
problema é que, na prática, uma família não tem esse poder", disse
ele.
Decisão abre precedente
A decisão do STJ não cria uma
jurisprudência para o caso, já que pode ser contestada em outras
turmas da entidade. Isso significa que o julgamento de casos
futuros de mesma natureza não recebe uma decisão automática
pela mesma conclusão. No entanto, ela abre um precedente
importante.
"A decisão não tem força vinculante e
não passa a ser automática, mas ela abre precedente e serve como
indicação para ajudar que o Judiciário decida da mesma forma em
julgamentos futuros", disse Patullo.
Segundo ele, há muitas reclamações e
processos relativos a problemas desse tipo, em que famílias que têm
seu plano de saúde por meio de uma microempresa têm o convênio
cancelado pela fornecedora, e, no geral, as decisões nos tribunais
estaduais já vinham dando o ganho de causa para as famílias. É,
porém, a primeira decisão do gênero no STJ, o que cria uma espécie
de referência nacional para a questão.
Microempresa precisa estar
regular
Mesmo com essa nova decisão do
STJ, o micro ou pequeno empresário deve ter uma empresa
formal e regularizada para poder contratar um plano empresarial por
meio dela. Isso vale mesmo que os beneficiários sejam apenas
membros da família, geralmente incluídos como dependentes do dono
da empresa, que é o titular do contrato.
Desde o final do ano passado, uma resolução da
ANS (432/3017) determina que, para ser
elegível a um plano empresarial, o empresário individual deve ter a
documentação de seu negócio em dia, o que inclui a inscrição nos
órgãos competentes (Junta Comercial ou outro) e sua regularidade
cadastral na Receita Federal por, no mínimo, seis meses.
A intenção da ANS era justamente
inibir a abertura de empresas apenas para que as pessoas
conseguissem contratar um plano de saúde para si e para os
dependentes da família, prática que cresceu conforme os planos
individuais, que têm regras mais duras da ANS, foram sumindo do
mercado.