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Polícia investiga fraude no seguro DPVAT

Fonte: CQCS Data: 23 junho 2014 Nenhum comentário

A Polícia Civil investiga um esquema de fraude no seguro DPVAT em Rio Preto com possível participação de funcionários do Hospital de Base (HB). O inquérito foi instaurado pelo 1º Distrito Policial por determinação do Ministério Público, a partir de auditoria da seguradora Líder, responsável pelo gerenciamento do DPVAT no Estado, que constatou fraude em recibo com despesas médicas da filha do borracheiro J.F.S.J.. A menina de 9 anos fraturou o fêmur em acidente de moto em 2012. Além desse caso, outras vítimas de acidentes ouvidas pelo Diário nas duas últimas semanas indicam que esse suposto esquema pode ser muito maior. Todos os casos envolvem um personagem em comum: o técnico em gesso do HB Luís Antônio Lima.

DPVAT ‘pagava’ despesa custeada pelo SUS

A menina J.V.D.F., 9 anos, passou por nove cirurgias no Hospital de Base para corrigir a perna atingida por um automóvel quando ela andava na garupa da moto do pai, o borracheiro J.F.S.J., 35 anos. Sem nenhuma despesa para a família, já que todo o tratamento foi custeado pelo SUS. Mesmo assim, o pai recebeu R$ 2,6 mil como ressarcimento de despesas médicas – curativos supostamente aplicados na jovem. A seguradora Líder, que gerencia o DPVAT no País, desconfiou e instaurou sindicância. Os auditores ouviram o borracheiro e, diante da confirmação de que ele não pagou um centavo por despesas médicas, encaminharam o falso recibo ao promotor Marco Antônio Lelis Moreira, que determinou a instauração de inquérito para apurar os crimes de estelionato e de falsidade ideológica.

O Diário ouviu a versão do borracheiro, sob a condição de não identificá-lo. Ele disse que foi procurado pelo técnico de gesso do HB Luís Antonio Lima quando a filha ainda estava internada. “Nesses dias em que aconteceu o acidente, dentro do hospital, um tal de Luís (…) abordou a gente, disse que entraria com o DPVAT e receberíamos o que tínhamos direito”, disse. Meses depois, recebeu R$ 2,6 mil. Até agora, o borracheiro foi o único ouvido pela delegada-assistente Márcia Ferreira da Silva, do 1º Distrito Policial. “Estou tranquilo. Não fiz nada errado”. A filha dele segue em tratamento. A delegada disse que vai intimar a técnica em enfermagem que assina o falso recibo e o médico do HB que atendeu a paciente. “Encaminhei ofício ao Coren (Conselho Regional de Enfermagem) para identificar onde essa profissional trabalha”, disse Márcia, que não revelou os nomes dos suspeitos.

Fisioterapia

O metalúrgico A.F.S., 27 anos, se diz vítima de situação semelhante. Em agosto de 2012, ele ia trabalhar de moto em Bálsamo quando bateu na traseira de um carro na rodovia Euclides da Cunha. Quebrou as duas pernas e teve fratura exposta em uma delas. Atendido no Pronto-Socorro de Mirassol, onde mora, foi transferido para HB. Operado, estava no quarto quando Lima apareceu. Segundo o metalúrgico, o funcionário do hospital ofereceu o DPVAT e pediu seu endereço. Dias após ter alta, conforme A.F.S., Lima apareceu. Inicialmente, o metalúrgico recusou. “Sabia que era rolo”. Lima insistia. “Ele ficava falando ‘vamos garantir o leite das crianças’”. O metalúrgico cedeu. Assinou o pedido de indenização e fez sessões com um fisioterapeuta. “Disse a ele que não tinha dinheiro. Ele disse: ‘Não, o fisioterapeuta é do escritório, do DPVAT, na hora em que receber, você me paga’.”

A.F.S. afirma ter feito “umas sete” sessões. Na última, o fisioterapeuta teria pedido para ele assinar os recibos ( o metalúrgico afirma não se lembrar quantos). Meses depois, A.F.S. disse ter recebido cerca de R$ 400. Lima teria telefonado e pedido todo o dinheiro com o argumento de que repassaria para o fisioterapeuta. No entanto, segundo A.F.S., cada sessão custou R$ 13, o que daria R$ 91. Ele aceitou pagar a Lima apenas 30%. “Eu disse que não era justo ele usar meu nome para receber dinheiro em cima de mim.”

HB reprova funcionário e abrirá sindicância

A direção do Hospital de Base criticou a conduta do técnico em gesso Luís Antonio Lima e prometeu instaurar sindicância para apurar o caso. “Nossa orientação (para os funcionários) é não ter relação com o DPVAT. Se alguém faz isso (aborda os pacientes dentro do hospital oferecendo o seguro) não tem o consentimento da direção, porque é contra nossos procedimentos”, disse o superintendente do HB, Jorge Fares. A direção do hospital também encaminhou nota em que “repudia este tipo de atitude e a classifica como inadmissível”. “A instituição irá apurar com rigor estas denúncias e ressalta que já está tomando providências internas em relação ao caso. A direção da instituição também se coloca à total disposição das autoridades para colaborar nas investigações.”

Procurado, Lima admitiu trabalhar como corretor de seguro DPVAT, mas negou irregularidades. Nos casos do borracheiro J.F.S.J. e do metalúrgico A.F.S., disse apenas ter repassado os recibos médicos à seguradora. “A pessoa emite a nota e eu repasso sem saber (se é verdadeira ou falsa)”, disse. Ele ainda negou exibir percentuais sobre o ressarcimento de despesas médicas, o Dams. “É tudo da pessoa (que sofreu o acidente).”

Lima também negou suposta falsificação da assinatura de vítimas no trânsito nos pedidos de indenização ao DPVAT, como seria o caso do montador C.E.O.S.. “A pessoa assina para mim, em um formulário que já anda na minha pasta.” Lima rebateu a versão de que ele aborda acidentados no trânsito dentro do HB. “Trabalho na base da indicação. É difícil (as pessoas me procurarem). O hospital é grande.” E ressaltou trabalhar com outras nove pessoas na corretagem do seguro DPVAT em Rio Preto.

Sem intermediários

A assessoria da seguradora Líder, que controla o DPVAT no País, confirmou que faz auditorias em pedidos de indenização com suspeitas de fraude. Mas não se pronuncia sobre investigações em andamento, nem informa o número de sindicâncias instauradas em Rio Preto. A seguradora ressalta que não é necessário intermediários para dar entrada no pedido de indenização. A quantidade de indenizações do DPVAT pagas em 2013 cresceu 25% em relação ao ano anterior, de acordo com a Líder. A empresa não informou, em seu balanço anual, os valores pagos.

Do total arrecadado pelo DPVAT – o seguro é pago por donos de veículos no início do ano, junto com o IPVA – 45% são repassados ao SUS para custeio do atendimento às vítimas de acidentes de trânsito e 5% são repassados ao Ministério das Cidades para aplicação exclusiva em programas destinados à educação e prevenção de acidentes de trânsito. Os demais 50% são gastos no pagamento das indenizações.

DPVAT 1

Site confirma pagamentos por ‘despesas’

O site do seguro DPVAT comprova que a revendedora A.A.S., 45 anos, recebeu R$ 2,5 mil referentes a despesas médicas, o chamado Dams, decorrente de acidente de trânsito que ela sofreu em agosto de 2012. A.A.S. ia de carro de Paulo de Faria, onde reside, até Riolândia, com a filha e o neto de 9 anos pela rodovia Waldemar Lopes Ferraz (SP-322) quando o carro invadiu a pista contrária e bateu de frente com outro automóvel que vinha em sentido contrário.

A filha morreu no local. A revendedora e o neto foram encaminhados para o Hospital de Base. Lá, ela teria sido procurada por Luís Antonio Lima, que teria ingressado com o pedido de ressarcimento. Ela acredita que o próprio Lima teria pego o seu prontuário médico no HB, necessário para dar entrada no pedido. “Acho que ele pegou, porque eu não peguei nada.” A revendedora também garantiu que todo o tratamento foi pelo SUS, sem nenhum custo para ela. A.A.S. não disse se repassou parte do valor recebido para Lima ou se ficou com todo o dinheiro.

Com o montador C.E.O.S., 21 anos, o enredo é diferente. Em janeiro, quebrou uma das pernas em acidente de moto em Nova Granada. No HB, foi procurado por Lima. Assinou o pedido de indenização do DPVAT e recebeu o dinheiro. Três meses depois, durante uma forte chuva, voltou a cair de moto. Novamente recebeu a visita de Lima, mas dessa vez garante não ter assinado os papéis para pedir mais uma indenização. “Não assinei nada. Ele não falou nada que era para assinar.” Mesmo assim, o montador recebeu R$ 1,68 mil de indenização, conforme atesta a página do DPVAT na internet. As vítimas só aceitaram falar com a reportagem sob a condição do anonimato.

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