O prefeito Fernando Haddad (PT) estuda uma forma de levar postos
de saúde privados à periferia de São Paulo. A ideia é oferecer uma
contrapartida a empresas do setor dispostas a instalar leitos,
laboratórios ou consultórios médicos em regiões que hoje são
atendidas apenas pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Dar isenção
tributária é uma das possibilidades trabalhadas pela atual
gestão.
O objetivo é dividir a responsabilidade com planos de saúde
populares, que vendem serviços nos extremos da cidade, mas só
mantêm unidades nas áreas centrais. De acordo com estimativa da
prefeitura, apesar de 56% da população pagar algum tipo de convênio
médico, boa parte desse total utiliza a rede pública, que, por sua
vez, não é ressarcida pelos planos de saúde.
Segundo o secretário municipal da Saúde, José de Filippi Junior,
essas empresas poderiam ser incluídas no Arco do Futuro, projeto
que visa a descentralização do desenvolvimento da cidade, criando
mecanismos que aproximem a moradia do trabalho do paulistano. Ele
defende, por exemplo, a isenção fiscal como forma de atrativo,
assim como deve ocorrer com empresas do setor da construção.
— Acho que é uma coisa de médio prazo, mas tem espaço para isso.
Como secretário, eu posso contribuir. Os serviços de Saúde
contribuem com ISS, são prestadores de serviço.
Ele argumenta que é melhor cobrar da iniciativa privada uma
melhor distribuição dos serviços pelo território do que esperar o
Ministério da Saúde cobrar dos convênios o ressarcimento pelo
atendimento no SUS — conforme previsto em lei.
— Eu não quero dinheiro. Eu quero que eles montem um hospital,
uma maternidade lá (na periferia). Porque não tem. E os segurados
deles aonde vão procurar atendimento?. Eu até falei com o ministro
da Saúde, Alexandre Padilha. Como conceber uma região de um milhão
de habitantes, como M'Boi Mirim, na zona sul, sem um único leito
privado? Há 400 mil pessoas lá com convênio médico. A ANS (Agência
Nacional de Saúde) tem de começar a regulamentar isso.
Mas, na opinião de Filippi, só o ressarcimento não resolve, já que
as unidades do SUS continuariam sendo procuradas por pacientes com
plano de saúde. E assim, permaneceriam superlotadas, sem condições
de prestar bom atendimento.
Outorga
Creditada ao ex-ministro da Saúde Adib Jatene, a Outorga Onerosa
da Saúde chegou a ser cogitada durante a gestão de Gilberto Kassab
(PSD). O então secretário Januário Montone apresentou a ideia na
Câmara Municipal, em novembro de 2008. Mas não teve acolhida entre
os vereadores.
O projeto consiste em cobrar do setor privado um valor pela
construção ou ampliação de hospitais em regiões já saturadas, como
o centro expandido, os eixos das Avenidas Paulista e Brigadeiro
Faria Lima. E, com o dinheiro pago, abrir um fundo para financiar a
construção de unidades de saúde na periferia — ou ainda obrigar o
empreendedor a construir um hospital menor onde há carência de
vagas.
A ideia também poderia ser adaptada para que a iniciativa
privada financiasse o home care, o atendimento médico em casa. Mas,
em ambos os casos, Montone destaca um entrave: depois de instalada,
quem faria a manutenção da unidade ou do serviço viabilizado por
meio da outorga? A saída, segundo ele, é negociar caso a caso.
O ex-secretário cita como experiência a negociação bem-sucedida
entre o município e a Beneficência Portuguesa durante a gestão
Kassab.
— Eles queriam aumentar o atendimento privado na região da Bela
Vista, e nós não concordamos. Negociamos e a Beneficência, que já
tinha um projeto de hospital na zona leste, acabou arrendando o
antigo Nossa Senhora da Penha. Lá, funcionam hoje quase 500 leitos
exclusivamente atendendo pelo SUS.
Eduardo de Oliveira, secretário-geral da Federação Brasileira de
Hospitais, disse que o País perdeu cerca de 100 mil leitos
lucrativos (privados) entre o fim da década de 1990 e início dos
anos 2000, especialmente nos bairros mais afastados e regiões mais
carentes.
— Não houve reposição desses leitos.
Isso aconteceu, segundo ele, porque a carga tributária para os
hospitais é de 20%, o que tornava inviável manter as unidades em
regiões com menor poder econômico.
Para ele, se a proposta do prefeito Haddad incluir a desoneração
desse imposto, pode ser um bom caminho.
— O prefeito está no caminho certo. É preciso fazer alguma
coisa. Se isso acontecer, será uma corrente de estímulo para dar
condições da rede privada voltar a prestar serviços junto com a
rede pública.