* Antonio Penteado Mendonça, O Estado de S.
Paulo
É
bom lembrar que a rede de regulação e pagamento de indenizações
gerenciada pela Seguradora Líder atende todo o território nacional
e funciona bem. Não levar isso em conta será apenas repetir a
tendência brasileira de reinventar a roda
Faz
pouco tempo, a assembleia das seguradoras integrantes do Consórcio
do DPVAT decidiu pela extinção do Consórcio. Isso quer dizer, na
prática, que a Seguradora Líder, gestora do DPVAT, o seguro
obrigatório de veículos automotores terrestres, vai operar como uma
seguradora plena, vendendo os bilhetes, apenas até 31 de dezembro.
Depois dessa data, ela passa a ser responsável pelo run off da
carteira e o encerramento do modelo atual do seguro obrigatório,
fazendo os acertos necessários para honrar os passivos e liquidar
as ações judiciais em curso.
Até
agora não está claro quem fez força para acabar com o DPVAT. A
participação da Susep (Superintendência de Seguros Privados) no
processo é indiscutível, com o preço atual do seguro sendo a prova
insofismável do interesse da autarquia em inviabilizar a operação
da Seguradora Líder. Como se não bastasse, a Susep nunca escondeu
que queria se apropriar de bilhões de reais em reservas,
constituídas com recursos privados, com finalidade específica,
administrados por uma empresa privada, na qual o governo nunca
colocou um centavo, nem tem participação acionária.
O
DPVAT e a Seguradora Líder foram sistematicamente acusados de
impropriedades e até de fraudes que, curiosamente, nunca foram
trazidas a público, exceto os golpes contra o seguro, nos quais a
Líder, evidentemente, é a vítima e não a autora. Crime não se
alega, se prova. E esta prova está faltando, mas a discussão,
agora, não é o passado e sim, o que pode e deve ser feito num
futuro muito próximo.
A
partir de 1.º de janeiro, o DPVAT deixa de ser comercializado pela
Seguradora Líder, em função da decisão das seguradoras integrantes
do consórcio do seguro obrigatório de acabar com ele. Sem a
comercialização pela Seguradora Líder, o Brasil deixa de ter a
única proteção de perto de 400 mil famílias que recebem anualmente
indenização em função de acidentes de trânsito acontecidos no país.
Quando digo anualmente, não quer dizer que as mesmas famílias
recebem todos os anos o seguro obrigatório. Quer dizer que todos os
anos o trânsito joga na conta da violência 400 mil novas vítimas,
que geram e recebem indenizações por morte, invalidez permanente e
despesas médico-hospitalares.
A
imensa maioria das vítimas dos acidentes de trânsito são pessoas
das classes D e E, ou as mais pobres da pirâmide social brasileira.
Quer dizer, são pessoas que recebem um salário mínimo por mês ou
menos. O DPVAT não é atualizado há mais de dez anos e, todavia, sua
indenização por morte corresponde a 12 salários mínimos, ou seja,
no caso da morte de seu arrimo, a família da vítima receberá o
equivalente a um ano de remuneração do trabalho do morto.
É
este benefício – a única compensação efetivamente paga às vítimas
dos acidentes de trânsito – que deixa de existir a partir de
janeiro. A proposta não é manter o DPVAT como ele fluiu até aqui.
Isso está fora de questão, mas o País não pode ficar sem um seguro
com as mesmas características do DPVAT, porque, sem ele, centenas
de milhares de pessoas que já vivem na pobreza, em caso de serem
vítimas de acidentes de trânsito, correm o risco de caírem na
miséria.
A
matéria depende do Congresso Nacional. O DPVAT é previsto em lei
federal, então é lá que é o foro para a discussão do que deve ser
feito. O que não pode acontecer é esta discussão demorar, não
apenas pelo já exposto, mas porque a operacionalização de um seguro
como este, com abrangência nacional, pagando indenizações em áreas
desenvolvidas e em outras miseráveis, é complexa, cara e exige uma
sofisticada rede de atendimento, sob risco de, em não existindo, as
indenizações não serem pagas e as fraudes se multiplicarem.
É
importante lembrar que a rede de regulação e pagamento de
indenizações gerenciada pela Seguradora Líder atende todo o
território nacional, está implantada e funciona bem. Não levar isso
em conta será apenas repetir a antiga tendência brasileira de
reinventar a roda quando o mundo viaja de avião.
*SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO-GERAL DA
ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS