É possível oferecer melhores
serviços ao usuário e reduzir custos na saúde
suplementar
Quem utiliza planos de saúde no
Brasil é mais ou menos saudável do que aqueles que não contam com o
serviço? O Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS)
divulgou em janeiro a resposta para essa pergunta. Baseado em dados
da Pesquisa Nacional de Saúde, o levantamento compara a incidência
de fatores de risco como pressão alta, maus hábitos alimentares e
baixa frequência de exercícios entre esses dois grupos. Em 50% dos
indicadores, quem tem plano saiu em desvantagem. Os beneficiários
dos convênios consomem mais doce e sal e substituem refeições por
pizza e outros alimentos industrializados com mais frequência do
que quem utiliza o Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, também
sofrem mais com pressão alta, diabetes ecolesterol alto (veja
quadro “Maus Hábitos”).
Esses hábitos são os principais
causadores de doenças crônicas não transmissíveis, como câncer,
diabetes, doenças cardiovasculares e respiratórias. Dados do
Ministério da Saúde apontam que elas foram responsáveis por 69% das
mortes no Brasil em 2016. No mundo, esse índice é de 63%. “Quem tem
plano tende a se cuidar menos”, explica o cancerologista,
especialista em farmacoeconomia e professor de bioética na
Universidade de Brasília (UnB), Marcos Santos. “Isso mostra a
importância de prevenir o que causa as doenças crônicas.” De
acordo com estudo do IESS, fazem-se necessários investimentos em
programas que auxiliem as pessoas a melhorar seus hábitos de
vida.
O ditado “prevenir é melhor do que
remediar” faz bem tanto para a saúde dos beneficiários quanto para
a do sistema suplementar. A prevenção evita que o problema apareça.
Se mesmo assim ele surgir, todos os esforços devem se focar em
detectá-lo e tratá-lo o mais rápido possível. “Além de ampliar as
chances de cura, isso reduz custos com intervenções caras que nem
sempre são eficazes em estágios avançados de algumas doenças”,
afirma Rafael Schmerling, oncologista clínico do Hospital
Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Um estudo realizado pelo Centro
Paulista de Economia da Saúde da Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp) que analisou o período de quatro anos de despesas de 274
usuários de planos de saúde demonstrou que 70% dos gastos ocorreram
no último ano de vida do paciente. Internações clínicas
representaram 89,2% dos custos. “Boa parte desse ônus poderia ser
evitado se o paciente recebesse o tratamento adequado logo que os
primeiros sintomas são detectados”, afirma Schmerling. Segundo o
oncologista, cirurgias para retirada de tumores e lesões
pré-cancerígenas identificadas logo no início podem resolver 95%
dos casos de câncer sem que seja necessário recorrer a terapias
mais longas e mais custosas, como quimioterapia, radioterapia e
imunoterapia. Além de facilitar a cura, remover uma pinta
precursora de melanoma é cerca de 200 vezes mais barato do que
tratar a doença. Por exemplo: Se removemos uma pinta que já é
maligna (já sofreu a mutação, já é melanoma), mas ainda é
superficial, também, tudo resolvido. Se esta pinta já tiver
crescido, a chance de disseminação vai crescendo
proporcionalmente.
Prevenção x
diagnóstico
Para o oncologista e especialista
em economia da saúde Stephen Stefani, os planos deveriam priorizar
programas de prevenção e de diagnóstico precoce que são mais
custo-efetivos. Alguns tipos de rastreamento, ou diagnóstico
precoce, se enquadram nesta mesma lógica. Na lista estão os exames
para detecção de quatro tipos de câncer: útero, mama, melanoma e
colorretal. “Se os planos de saúde se concentrassem em programas
regulares de rastreamento desses quatro tipos de câncer, já
teríamos um impacto considerável na redução de custos para todos”,
afirma Marcos Santos, da UnB. Mas esses exames só são eficientes
quando focados na população e na faixa etária corretas. Mamografias
antes dos 40 anos podem gerar biópsias desnecessárias, e depois dos
70 anos, têm poucas chances de detectar um câncer agressivo. Por
isso, o exame é recomendado para mulheres entre 50 e 70 anos. Para
os casos complicados, há tecnologias que recomendam o tratamento
mais adequado a cada doente. O sequenciamento genético identifica
grupos de pacientes para os quais drogas mais caras funcionam ou
não. “Não faz sentido utilizar um medicamento de 50.000 reais que
não vai prolongar a vida da pessoa”, diz Santos.
Mudanças no modelo de
pagamento
Especialistas defendem uma revisão
dos modelos de remuneração de médicos e provedores de serviços de
saúde. No Brasil, assim como nos Estados Unidos, eles costumam
receber por procedimento realizado, o que incentiva exames e
intervenções excessivas (veja quadro).
A Inglaterra, por exemplo,
estabelece um teto máximo para o valor de tratamentos e
procedimentos que se baseia nos anos de vida com qualidade que eles
proporcionam às pessoas. Se o paciente teve sucesso no tratamento e
qualidade de vida, o provedor da solução recebe o valor completo.
Caso haja alguma intercorrência, existem critérios que preveem o
reembolso parcial da terapia ou procedimento. “Temos de passar a
remunerar médicos e prestadores de serviço por seus resultados”,
diz Santos. “Para isso, precisamos tornar os indicadores de
performance mais objetivos e criar métricas de sucesso para cada
especialidade.”
Também é necessário pensar num
modelo de mensalidade ou bonificação que incentive o usuário dos
planos a cuidar melhor da sua saúde. “Por que quem faz exercícios e
exames regulares tem que pagar o mesmo valor de quem fuma e não se
exercita?”, questiona Stefani. Para ele, as operadoras poderiam se
inspirar no modelo de seguro de carro, que dá desconto ao motorista
que não tem multa e cobra mais do que tem mais chances de se
envolver em acidentes. “Esse conjunto de medidas já traria um
retorno considerável para a saúde financeira dos planos e o
bem-estar dos pacientes.”
Gestão de
custos
O que deu certo no Brasil e no mundo para melhorar o atendimento ao
paciente e alterar comportamento para otimizar recursos na
saúde.
Pagamento por
pacote
A ciência comprova que uma dose única de radioterapia já é eficaz
para reduzir dores em pacientes com metástases no osso e evitar
excesso de radiação. Mas a maioria recebe dez. Estudo da UnB de
2017 passou a remunerar os serviços por um valor fixo. Antes da
mudança, apenas 3% das pessoas receberam uma única dose. Quatro
anos depois, foram 49%, o que diminiu 35% no custo por
paciente.
Visitas para substituir o
PS
Estudo da faculdade de medicina da Universidade do Texas mostrou
que visitas de agentes comunitários de saúde e acompanha mento de
pacientes podem reduzir custos com atendimentos desnecessários em
emergências médicas em 4,4 bilhões de dólares por ano, o
equivalente a 12 bilhões de reais.
Cuidados paliativos em
casa
Para melhorar a qualidade dos últimos dias de vida de pacientes
terminais, o estado de Ontario, no Canadá, implantou um programa de
cuidados paliativos em casa. A iniciativa aumentou as mortes no lar
e reduziu custos em cerca de 4.400 dólares (cerca de 12.000 reais)
por paciente.